domingo, 26 de abril de 2015



SAXON – WHEELS OF STEEL

A Inglaterra é considerada a pátria-mãe do heavy metal. O Saxon, talvez, nunca tenha chegado ao status de maior banda do estilo, mas, para mim, não existe nenhuma banda, de rock pesado ou não, que seja mais associada ao território bretão. Mesmo considerando Beatles, Kinks, Iron Maiden, Sex Pistols, Clash, Led Zeppelin e outras, considero o Saxon como a mais inglesa de todas bandas.
O motivo para isso eu não sei. Talvez seja a associação, feita na juventude, entre o nome – Saxão – e os livros de história, que esclareciam que aquela era uma tribo que iria, juntamente com os Anglos, formar o que viria a ser, séculos depois, o reino da Inglaterra.
Tendo surgido no levante de bandas que ficou conhecido como NWOBHM, o Saxon nunca se afastou essencialmente da sonoridade que caracterizou aquele momento. Se o Iron Maiden se tornou a maior banda do movimento, e, na sequência, a provável melhor banda de todo o heavy metal,gradualmente distanciando-se do som que fazia em sua origem, o Saxon fincou os pés em suas características e é a maior banda dentre as poucas que ainda soam essencialmente como NWOBHM. Teve altos e baixos criativos, é claro, como qualquer grupo com tanto tempo de estrada, mas não tem nenhum disco especificamente ruim, nenhum disco experimental. São a pura essência do peso britânico.
Escolher Wheels of Steel, para falar sobre, não foi uma decisão fácil. Nem sei se seria a mesma em outro dia ou outro momento. Wheels of Steel e os dois discos que vieram em seguida, Strong Arm of the Law e Denim and Leather, são, para mim, uma das mais coesas trilogias já feitas. Discos trigêmeos, lançados no espaço de tempo compreendido entre um ano e cinco meses. Há tantas semelhanças entre eles que não admira que tenham sido a base do repertório que gerou, logo em seguida, um dos melhores discos ao vivo de heavy metal: The Eagle Has Landed.
Tal qual suas contemporâneas, o Saxon fundiu a agressividade do punk, combinando velocidade motorheadiana e linhas melódicas de guitarra, inspiradas no que já vinham praticando bandas como Judas Priest e UFO. Na tendência dessas últimas referências mencionadas, temos, no disco, as maravilhosas 747 (Strangers in the Night) e Suzie Hold On. Pelo lado das primeiras, praticamente todo o restante: Motorcycle Man, Street Fighting Gang, Machine Gun, Freeway Mad, Stand Up and Be Counted, See The Light Shining  e Wheels of Steel são músicas para exercício de vértebras cervicais. A banda, em seus anos iniciais, com sua primeira formação clássica, já soava entrosadíssima.

O reconhecimento da influência do Saxon deveria ser mais exposto, mais declarado, mas dizer que é influenciado por eles é o similar perfeito da frase “eu toco heavy metal” e, portanto, sua projeção salta mais aos olhos nas bandas que se empenham em executar o estilo na sua forma mais pura. Bandas como Exciter, Running Wild, Armored Saint e até novatos na cena, como o Enforcer, prosseguem com o legado do gigante insular que ainda está de pé, dando sangue, longe de pensar em se deitar sobre seus louros, mas construindo novos alicerces para a música que ajudou a consagrar.

domingo, 19 de abril de 2015




BODY COUNT – BODY COUNT

Misturar estilos é sempre perigoso e arriscado. A tendência purista de quem é aficcionado por música tende a levantar barreiras contra quaisquer tentativas de subverter os dogmas de seus gêneros musicais preferidos. O que se poderia dizer, portanto, da tentativa de unir rock pesado com rap? Living Colour, Rage Against the Machine e Beastie Boys transitaram por essas experimentações e o Anthrax brincou um pouco com a idéia em uma ou duas músicas lançadas em EPs, mas ninguém foi tão agressivo quanto Ice-T e o seu Body Count.
Ice-T já era um músico consagrado dentro do seu estilo que, por sinal, corresponde à facção mais agressiva dentro do hip-hop, o gangsta rap. Desconheço suas raízes dentro do rock, o que ele ouvia quando era mais jovem ou coisas assim, mas reconheço que ele foi muito bem sucedido em sua empreitada, porque não se meteu a querer reinventar a roda. O primeiro álbum do Body Count é um disco de punk rock bem cru. Não tem nenhum grande instrumentista entre os músicos e, portanto eles vão direto ao ponto, direcionando ao som básico e acertando no alvo. Arrisco até a dizer que, fora o timbre da voz de Ice-T, rapidamente associado ao seu estilo de origem, pouco vai ser encontrado de rap aqui.
Até a capa, se for bem observada, não se afasta do estilo de capa tradicional utilizada por bandas de heavy metal. Basta imaginar Conan nascendo em um gueto de Los Angeles, sendo membro de gangue e trocar a espada pelo revólver. Pronto. Está formatado mais um disco extremamente representativo de sua época, os anos noventa, onde misturas foram priorizadas, mas as tradições foram mantidas. Em 1992, ano em que esse álbum foi lançado, vieram também ao mundo obras importantes de bandas como Megadeth, Pantera, Iron Maiden, Dream Theater, Alice in Chains, Ministry, Black Sabbath, Manowar, Fear Factory, Kyuss, Napalm Death, WASP, Faith no More, Kiss e Tiamat. Ou seja, há algum exagero na forma como essa década é vista, porque opções eram abundantes e sortidas.
O disco é repleto de pequenas vinhetas, tratando, em geral, sobre situações de racismo. A primeira música, Body Count in the House, soa mais como introdução, pois, quando a faixa-título, Body Count, começa, o disco mostra ao que veio. Baseada na marcação da bateria, a música lhe puxa pra acompanhar o refrão! Mais uma vinheta e surge uma faixa mais rápida, Bowels of the Devil. Excelente!
Eu não posso me omitir de mencionar Cop Killer. Sem entrar no contexto polêmico de sua letra, a música – em sua essência – é apenas legal, sem nada de mais. Por conta da censura sofrida, ela foi omitida da prensagem inicial do álbum, mas, sinceramente, nem faz tanta falta. O disco está repleto de várias outras músicas bem melhores, tal qual, por exemplo, KKK Bitch, a pesadona Voodoo, a power ballad The Winner Loose e There Goes the Neighborhood, com sua ótima letra, como teria realmente que ser, para quem é egresso de um estilo tão fundamento na construção destas.

Quando eu conheci o disco, lá atrás no tempo, tive um estranhamento inicial. Natural, porque os ouvidos, calejados com outra sonoridade, levam um tempinho para assimilar. Hoje, já nem percebo mais. Escutei tanto esse álbum, ao longo dos anos, que atualmente ele me soa apenas como o que tem que ser e é: um disco de rock pra ouvir no máximo!

domingo, 12 de abril de 2015



HELLOWEEN – THE TIME OF THE OATH

A concepção da obra-prima deve ser o melhor acidente de percurso na trajetória de uma banda. Ter o seu talento reconhecido, retratado em um momento específico da carreira onde tudo convergiu para a criação daquele álbum que, doravante, permanecerá perpetuado no seleto grupo de obras consideradas clássicas.
Mas o que deveria ser júbilo acaba, por vezes, tornando-se transtorno. O mesmo fã que consagra é aquele que constrange e delimita a carreira de seus ídolos. O álbum inovador finda por tornar-se uma prisão criativa e as pessoas começam a cobrar por um novo Bonded by Blood, um novo Painkiller, um novo Reign in Blood, um novo Master of Puppets, deixando de dar o devido reconhecimento a discos seguintes, que são diferentes, mas tão bons quanto os consagrados.
O Helloween fez a saga Keeper of the Seven Keys e disparou para o topo do cenário do heavy metal. Revelou um grande vocalista e criou uma sequência de canções que eternizou seu nome, além de dar origem a uma leva de seguidores, que estudaram e – isso não é necessariamente positivo – reproduziram suas idéias. Mas o que importa é que os Keepers já foram feitos e ponto final. A banda não os refez com outro nome. Criou dois novos discos que são, sim, muito bons, e que, até na arte das capas, afastaram-se um pouco dos conceitos fantasiosos que fizeram sua fama.
Mas não eram os Keepers.
E, mais na frente, no futuro próximo, um pecado ainda maior: Michael Kiske está fora.
A banda tomou o rumo adequado e se reconstruiu. Sabiamente, trouxeram um novo vocalista que não tinha nada a ver com seu antecessor. Tudo bem, Kiske era um mestre em sua função, mas as relações internas se deterioraram e ele saiu. Paciência, vamos andar para frente e tentar algo novo, pois emular o passado seria cair no pastiche.
 Ah, mas o vocalista novo tem voz de hard rock e não alcança as notas que Kiske alcançava… Dane-se! Onde está o maldito livro de regras que delimita os caminhos que uma banda escolhe seguir? E porque razão essa banda deveria virar imitadora de seus imitadores? Nada disso! A banda apostou no que tinha em mão e se deu bem. Lançou um primeiro trabalho ainda um pouco acanhado, Master of the Rings, mas, na sequência, pegaram impulso e lançaram um de seus melhores discos: The Time of the Oath.
Basta ouvir. Trata-se de uma fantástica sequência de músicas em que cada uma soa individualmente como um clássico. É o tipo de disco que pode ser tocado na íntegra em um show especial. Desde a abertura com uma faixa curta e bombástica como We Burn, passando pelo metal tradicional de Steel Tormentor e pela inusitada Wake Up the Mountain, chega-se até o, provavelmente, maior clássico da fase Andi Deris: Power. Uma música melódica, curta e direta, uma faixa tão importante, carismática e essencial dentro da carreira da banda tal qual o são Ride the Sky ou Eagle Fly Free.
Depois dessa perfeita sequência de quatro canções, vem uma balada para dar uma variada no clima, mas mantendo o nível do disco ainda no alto, pois Forever and One é uma das melhores – se não a melhor – faixa desse estilo já feita pelo Helloween.  Em seguida, a banda volta a carga com bastante agressividade em Before the War, fechando uma espetacular marca de seis faixas seguidas com absoluta perfeição.
Após toda essa catarse, o Helloween pôde se dar ao luxo de incluir algumas músicas de menor impacto, mas, entre as restantes, tem que se dar destaque ao hard rock de Anything My Mama Don´t Like, as faixas tipicamente helloweenianas Kings Will Be Kings e Mission Motherland, repletas de solos e passagens mais elaboradas e, por fim, a soturna faixa-título, The Time of the Oath, que encerra o disco em padrão altíssimo.

Andi Deris, se consagrou e firmou seu lugar na banda, independente de ainda haver viúvas do seu antecessor. Kiske e Deris, cada um, a seu modo, são excelentes e realizaram trabalhos insuperáveis dentro do Helloween. A banda prossegue, alternando acertos e erros, mas olhando para a frente, sempre um passo a frente de seus eternos clones.

domingo, 5 de abril de 2015



BLUE OYSTER CULT – SECRET TREATIES

Eu não consigo compreender muito bem porque é que alguns fãs de rock – ou de música, no geral – fazem tanto esforço pra autolimitar suas opções de fruição. Prendem-se tanto a um determinado estilo, ou a um numero específico de artistas e não se interessam em conhecer outros trabalhos, presentes, futuros ou antigos. É a lamentável postura do “não ouvi e não gostei”
Ouvir algo apenas uma vez e fechar um veredito de opinião também não é muito recomendável. A absorção de alguma obra pode depender do momento que você está passando. Óbvio que eu falo apenas sob minha perspectiva e o que serve pra mim não funciona pra outrem, mas foi assim que aconteceu comigo em relação ao Blue Oyster Cult. Escutei algo da banda esporadicamente, aqui e ali, e não me interessou muito. Um dia, porém, a música soou de outra forma e eu fiquei com aquela sensação de “onde é que eu estava com a cabeça antes?”. Não há explicação pra isso. Simplesmente acontece. Foi o momento certo.
Talvez o erro tenha sido tentar conhecer a banda através de uma coletânea. Geralmente, é um ótimo cartão de visita, mas nem sempre soa adequadamente. Determinadados discos precisam ser ouvidos na íntegra. Determinadas discografias merecem ser conhecidas na sequência.
Esse disco, Secret Treaties, por exemplo, é tão bom que você vai elegendo suas músicas favoritas conforme elas são apresentadas, e, no final, você não consegue mais separar uma das demais do conjunto. A primeira faixa, Carrer of Evil, é um típico hard americano do começo dos anos 70 e fica na sua cabeça por todo o resto do dia. A mesma representa uma autêntica colaboração entre os músicos da cena novaiorquina, já que a música do BOC permeia uma letra da grande poetisa punk daquela metrópole, Patti Smith. Eric Bloom, que canta a maior parte das músicas, tem uma voz excelente para o estilo. Está mais para o suave do que para o agressivo e chega até, em alguns momentos, a lembrar o timbre de Bob Dylan, como transparece em certos trechos da segunda música, Subhuman.

Ao longo de todo o trabalho, o Blue Oyster Cult passeia por sua mescla de metal, hard e progressivo, que, guardadas as individualidades mais herméticas, coloca a sonoridade do grupo como uma espécie de versão norteamericana do Uriah Heep, havendo similaridades inclusive na parte lírica, dada a predominância pelos temas místicos. Dominance and Submission prossegue com a variedade do repertório e é seguida por ME 262, que, para quem não sabe, é o modelo do avião que está na capa do disco. Depois de Cagey Cretins e Harvester of Eyes, o disco encerra com dois clássicos indispensáveis: Flaming Telepaths e Astronomy. Dois momentos absurdamente divinos. Duas faixas cuja vibração mescla-se com a beleza, daquela forma que faz com que você tenha vontade de entoar cada verso com ênfase. Não faltam bandas no universo para serem conhecidas. Existem aquelas que ultrapassaram os conceitos de gigantismo e existem aquelas que – justa ou injustamente – nunca se erguerão para além dos nichos. Na interseção, estão as bandas que tenham feito – ou ainda façam – sucesso, conceberam algo tão único que o tempo e as tendências vão passar, mas o nome delas sempre será lembrado e cultuado. Assim é o caso do Blue Oyster Cult. Minha opinião não deve ser de grande valia, mas se por um momento puder ser levada em consideração, ouça esse disco, conheça essa banda. Mesmo que você não goste, vai pelo menos ter vivenciado um pouco do que os seus ídolos desfrutaram em suas juventudes, os discos que eles escutavam quando estavam aprendendo a tocar.