sábado, 29 de agosto de 2015


DANZIG – DANZIG

É uma pena que o Danzig não tenha progredido para alguns degraus acima do status que estava ocupando. E realmente eu digo “estava”, pois, tal qual tantas e tantas outras bandas, o Danzig se enroscou na espiral de trocas infinitas de membros e acabou por perder a sua identidade. Deixou de ser reconhecido como uma banda e passou a ser visto apenas como Glenn e os seus músicos contratados.
Também não foi muito útil, para a carreira da grupo, o fato de Glenn ter uma postura inclinada para a arrogância. Sua tendência para se meter em brigas acabou por afastar o interesse de algumas pessoas que se deixam influenciar por motivos extramusicais. No entanto, o foco aqui é música e não a personalidade ou vida pessoal dos músicos e, nessa perspectiva, é mais do que óbvio que o vocalista era a figura principal ali, como o próprio nome da banda deixa bem claro. Não poderia mesmo ser de outra forma, afinal, ele já era dono de certa notoriedade, pela sua carreia como membro do Misfits e, posteriormente, do Samhain. Mas, apesar de sustentar-se em uma figura central, o Danzig funcionava perfeitamente como uma banda. Tinha uma ótima formação e obteve uma solidez capaz de gerar quatro excelentes discos, lançados no intervalo de seis anos, sendo esse presente álbum a sua estréia.
O Danzig criou uma identidade própria a partir de uma inusitada mistura de influências. A banda soava, na maior parte do tempo, como se fosse um cruzamento entre Black Sabbath e The Doors. Um doom metal com acento fortíssimo de blues e com letras em um tom macabro mais aprofundado, em oposição ao macabro no estilo filme trash que a banda inicial do cantor praticava e ainda pratica.
Nessa primeira fase de sua carreira, a formação da banda era a mesma que encerrou a carreira do Samhain, e foi também desse período que eles trouxeram a faixa de abertura, que se tornaria o primeiro clássico da nova empreitada, a música Twist of Cain. Essa faixa, com seu arranjo simples e andamento moderado, já diz o que deve se esperar do Danzig. Um tipo de hard metal setentista, pré-NWOBHM, sem arroubos de velocidade ou gandiosidade, mas com bastante feeling e eficiência. Duas ótimas músicas surgem na sequência: Not of this World e She Rides, sendo, essa última, bastante tendente para o blues, influência já anteriormente mencionada, e isso deixa tanto essa, como outras faixas, bem cantáveis. São pesadas, mas são dotadas de uma dose de melodia que as torna acessíveis para o ouvinte médio, apesar da obscuridade lírica.
The Hunter e Am I Demon são outros destaques, mas, em termos de evidência, ficam um pequeno passo atrás de Possession, que também foi aproveitada do Samhain, e Mother, provavelmente a faixa mais conhecida do Danzig. Daí pra frente, cada novo disco seria um passo adiante, em termos de composição e produção, até o infeliz equívoco que foi Blackacidevil. Não tenho nada contra o estilo industrial, muito pelo contrário, mas não compreendo a empreitada de um artista em remanejar o curso de sua carreira para um caminho sobre o qual não tem domínio ou intimidade. O resultado disso foi que o restante da banda não embarcou no projeto e Glenn acabou sozinho, afetando a trajetória ascendente que aos poucos galgava. Felizmente, o rumo da musicalidade foi reajustado em álbuns posteriores e a formação atual mantém o legado de uma banda com muita, muita personalidade.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015



IRON MAIDEN – PIECE OF MIND

O Iron Maiden, nos seus primeiros anos, era um ser em constante evolução. A cada novo disco, havia algum acréscimo em termos de arranjo, de pegada, que reafirmava e ao mesmo tempo melhorava o que tinha sido feito em seu passado. Catorze meses após ter explodido com The Number of the Beast, a banda lança o seu quarto álbum, Piece of Mind.
Não parecia haver limites que eles não pudessem extrapolar. As composições surgiam cada vez mais densas, mais elaboradas, com mais ênfase nas passagens instrumentais. Basta ver que a música que abre o disco, Where Eagles Dare, é, simultaneamente, uma típica faixa de início de álbum e, contraditoriamente, não é. Ela era impactante, mas também era muito instrumental e isso, em mãos inábeis, poderia ter diminuído a força da mesma. A força que uma música de abertura precisa ter. Nos seus seis minutos de duração, há um espaço de três minutos e meio, intercalando as aparições de Bruce Dickinson, ocupados por solos e variações ritmicas. Logo de cara, Steve Harris apresentou mais uma das fantásticas composições que criou sozinho, à altura de Phantom of the Opera, Hallowed be thy Name e, dentro desse mesmo disco, posicionada de forma a cercar todo o repertório, o épico To Tame A Land. Essa derradeira faixa é uma peça magnífica, inspirada no livro Duna. O fato de To Tame a Land estar posicionada no final do álbum, e ter o tipo de arranjo elaboradíssimo que tem, faz com ela soe para mim como se fosse a primeira música do álbum seguinte, tal a afinidade que tem o que ainda viria no futuro.
Se Harris veio com Where Eagles Dare, que ainda tem o bônus de conceder ao estreante Nicko McBrain a honra de executar os segundos iniciais de música do disco, Bruce Dickinson marcou de forma espetacular a sua primeira composição em um disco do Iron Maiden, com Revelations. São quase sete minutos de beleza, dramaticidade e dinamismo que confirmariam, mais uma vez, que ele era a pessoa certa no lugar certo. E para reafirmar isso, a música seguinte, feita em parceria com Adrian Smith, relativamente curta dentro do repertório do álbum, tornou-se uma das melhores canções da banda: Flight of Icarus é uma canção certeira, sem excessos, mas que tem todas as suas partes extremamente bem resolvidas, bem amarradas: introdução, estrofes, refrão, encerramento, tudo concebido com talento ímpar de composição.
As duas faixas seguintes são semelhantes no ritmo acelerado, mas Die With Your Boots On não teve a mesma sorte de The Trooper, eternizada nos setlists. Em todo caso, o melhor ainda estava por chegar e é curioso ver que Dave Murray, que assina tão poucas composições na banda, é co-responsável pela minha música preferida do Iron Maiden: Still Life. Somente uma banda com um repertório tão rico em opções pode se dar ao luxo de deixar em escanteio uma música como Still Life, também – e injustamente – ausente dos shows. O começo sutil, que evolui aos poucos, para a levada explosiva que a caracteriza, até a catarse do refrão, descrevem esse clássico. Até então, Murray só tinha crédito em Charlotte the Harlot e em Twilight Zone, mas Still Life é um salto imenso de qualidade sobre uma obra que, mesmo pequena, já era dotada de evidente excelência.

Das três últimas faixa, tirando a exuberância da já citada To Tame A Land, o destaque é Quest For Fire, que não nega ter sido composta também por Harris, visto a magnífica linha de baixo da mesma, que domina toda a sua duração. O Iron Maiden já era merecedor do status de banda da qual se espera muito e Piece of Mind correspondia a essa expectativa. Powerslave, o título do disco seguinte, era, de certa forma, um mero jogo de palavras que descrevia uma realidade evidente: A escravidão já tinha sido deflagrada.

sábado, 15 de agosto de 2015



ONSLAUGHT - THE FORCE

Acho incompreensível que essa obra de arte da agressividade quase nunca seja lembrada como um dos melhores discos de thrash metal já feitos. Perfeito, perfeito e absolutamente perfeito, eu o ranquearia entre os dez, cinco, ou até mesmo três melhores trabalhos concebidos nesse estilo. Esse é um daqueles álbuns que eu me lembro exatamente em qual loja comprei, lembro que era de manhã, lembro de tirá-lo de dentro do saco, dentro do ônibus, pra poder olhar a capa e o encarte e, principalmente, lembro de ouvi-lo muitas e muitas vezes, sem cansar, porque até hoje eu ainda não consegui cansar desse disco.
Eu não sei o que houve na Inglaterra que, depois de ter concebido a primeira e segunda geração de bandas de heavy metal, influentes em tudo até hoje, estagnou-se no período pós-NWOBHM. Tá certo que de lá ainda vieram o Skyclad, Anathema, Napalm Death, Benediction, Evile, Paradise Lost, Carcass e Dragonforce, entre alguns outros, mas ainda assim é uma contribuição acanhada considerando as três décadas e meia já passadas após o surgimento de Iron Maiden, Saxon, Venom e um monte de outros nomes mitológicos. Talvez seja realmente algo que tenha que ocorrer, pontualmente e intensamente em cada nação que abrace o estilo e, daí, o bastão foi passado para a América, Alemanha e Suécia, sem deixar de mencionar que o Brasil também teve o seu momento de explosão de surgimento de bandas.
O Onslaught é um dos destaques dessa leva de bandas citada acima e, talvez, se não tivesse tido uma carreira tão errática, trocando de vocalista toda hora, tivesse tido uma melhor sorte na cena. No primeiro disco, o responsável pelas vozes era o baixista Paul Mahoney, provavelmente cumprindo a função enquanto ainda estavam tentando configurar uma formação; no terceiro disco, chamaram o consagrado Steve Grimmett para cantar, mas o estilo do conjunto sofreu alterações no processo. No segundo disco, esse The Force, o vocalista foi Sy Keeler e, com ele, a formação alcançou o status de ser considerada a “clássica”, dentro de sua história. A voz de Sy caiu como se fosse mais um instrumento dentro dos arranjos, agressiva na medida certa, sem exageros, e subindo para agudos esporádicos, acentuando diversas passagens das músicas. Sy está longe de ser um cantor virtuoso e, por isso, se integrou tão bem, já que no Onslaught ninguém é virtuoso. São bons músicos que, juntos, conseguem extrair o melhor possível de suas colaborações.
Sendo portanto esse o álbum mais efetivo da primeira fase da banda, não foi à toa que o retorno deu-se com a presença de Sy, único membro que permanece até o presente, junto com o guitarrista Nige Rockett. Ao abrir o disco, o som da guitarra surge em um riff seco e preciso, que evolui gradativamente em intensidade quando os demais instrumentos aparecem para a execução da faixa Let There Be Death, uma mais do que explícita declaração de inequívoca paixão ao baluarte AC/DC, sendo que essa homenagem acabaria ficando mais escancarada no disco seguinte, mas isso é outra história. Essa música, juntamente com Fight With The Beast e Flame of The Antichrist são os grandes destaques do álbum, bem como o são também de todo o acervo do thrash metal.
Pensando bem, não importa se a Inglaterra já não concebe tantas bandas como o fez no passado. O que importa é que o que sai de lá ainda é relevante e tem qualidade incontestável. As bandas não precisam ficar se preocupando em recriar a roda, mas sim em honrar o legado deixado por aqueles que firmaram os fundamento do heavy metal, e isso o Onslaught faz com grande margem de excelência.

sábado, 8 de agosto de 2015



AND JUSTICE FOR ALL

Muito se debate sobre como o Metallica soaria se Cliff Burton não tivesse morrido. Em relação ao conteúdo do Black Album e seus lançamentos seguintes, não sei opinar, mas, em relação ao And Justice for All, eu creio que, com uma ou outra característica pontual, o disco não teria soado radicalmente diferente do resultado que conhecemos. Burton, apesar de ser peça-chave no som da banda, e de exercer certo grau de influência sobre os demais membros, não participava tão ativamente das composições, conforme pode ser percebido nos créditos do disco anterior, Master of Puppets, onde ele co-assina duas faixas apenas.
Creio, portanto, que a música do Metallica já estava correndo para aquela direção. Não à toa, quando o último disco – Death Magnetic – surgiu, anunciando a intenção da banda em tornar a tocar um estilo mais pesado, ele remeteu justamente a essa fase da carreira. 
Ao contrário também da crítica generalizada de que as músicas estavam muito complexas, com muitas partes, etc, eu também me oponho. É isso que faz o disco ser tão bom! Músicas que precisam ser absorvidas aos poucos e, a cada nova audição, vão revelando seus detalhes, crescendo para o ouvinte. Ressalte-se também que qualquer traço de intenções comerciais passou bem longe daqui: o álbum, no geral, tem o clima mais dark entre qualquer coisa já feita pelo Metallica, soando bem thrash, sem dúvida, mas não aquele thrash explosivo do começo, e sim algo mais cerebral, mais denso. E a produção, bem seca, evidencia a sensação de que a banda está executando tudo ao vivo, juntos no estúdio.
James Hetfield, que ainda não tinha se preocupado em aprender a cantar, estava cantando melhor do que nunca, com vocalizações bem rasgadas, no auge do cruzamento entre amadurecimento e crueza. Lars Ulrich, a outra metade da força motriz que dá vida à banda, também estava em ótima fase. Não obstante a sonoridade um pouco polêmica da timbragem dos instrumentos no disco – e mantendo-me à parte do já saturado debate sobre o som do baixo – Lars é, ou era, um baterista muito criativo, acrescentando, em todo o álbum, diversas viradas de bateria não apenas memoráveis, mas que chegam a ser quase cantáveis.
Em termos de sobrevida no setlist, One é o grande destaque do trabalho. Mais uma de uma sequência de falsas baladas, que começam bem melódicas e terminam como escavadeiras aceleradas. Apesar de um certo ar de previsibilidade nessa fórmula, a qualidade e o carisma das composições se sobrepõe à possibilidade de críticas. Das demais faixas, Blackened, And Justice For All e Harvester of Sorrow são as mais frequentes, marcando presença vez por outra nas apresentações. To Live is To Die merece ser mencionada por ser a música instrumental do álbum, intercalada brevemente pela recitação de alguns versos escritos por Cliff Burton, e Dyers Eve encerra o disco com a levada mais acelerada entre todas.

Embalado por sua capa icônica, And Justice For All cumpriu com êxito o papel de transição dentro da discografia do conjunto. Mesmo os arranjos complexos não alienaram os fãs mais tradicionais, já que esses, em sua maioria, abraçaram a tendência que a banda apontava. Surpreendentemente, ou talvez não, o Metallica deu uma guinada na carreira e percorreu um caminho inesperado, agradando alguns e desagradando outros, mas esse disco tem todos os méritos para ser a sequência natural da - assim chamada - tríade clássica de seus primeiros anos.