sábado, 27 de fevereiro de 2016



ICED EARTH – SOMETHING WICKED THIS WAY COMES

Os principais grupos musicais da história fizeram os seus nomes pela excelência do trabalho desenvolvido, mas não só por isso. Tal qual organismos vivos, que se perpetuam através da disseminação de seu DNA, bandas como Beatles, Led Zeppelin, Metallica, Helloween, Ramones, Black Sabbath ou Iron Maiden também geraram crias para povoar o planeta.
Isso me ocorreu pelo fato de que eu sempre associo o Iced Earth com a sua provável maior influência que foi o já citado Iron Maiden. Não se deve desprezar o fato de que as crias, para sairem das sombras de seus ancestrais, devem criar os seus próprios caminhos. Ninguém consegue, ou pelo menos não deveria, ir muito longe sem colocar seus temperos pessoais na mistura. O Iced Earth tem a sua influência exposta bem claramente, mas soube mesclá-la com uma parcimoniosa dose de thrash metal e uma generosa dose de personalidade própria, conseguindo, daí, o destaque pela sua distinção.
Apesar disso, não posso deixar de pensar no Iced Earth sem ter em foco a falta de gerenciamento interno que desviou o grupo da trajetória ascendente que lhe sorria. Nos anos noventa, o Iced Earth ocupou o vácuo gerado pelas grandes bandas de metal que estavam sem direção precisa e cresceu bastante. Cresceu a ponto de me fazer acreditar que poderia alcançar um lugar entre as bandas do primeiro escalão ou algo próximo disso, mas não foi o que aconteceu.
Não obstante a saída do carismático vocalista Matt Barlow, o que por si só já seria um golpe difícil de reverter, mesmo considerando a excelência de quem o substituiu, o fato é que – e isso é uma interpretação minha – o Iced Earth nunca foi, e até hoje ainda não é, de fato uma banda, na acepção mais restrita da palavra.  Sinceramente, alguém é capaz de listar quem são os membros atuais, fora o guitarrista e líder Jon Schaffer e o sujeito que estiver na posição de vocalista da vez. Ou, pior ainda, alguém pode mencionar se o Iced Earth alguma vez já possuiu aquilo que a gente chama de formação clássica??? Sim, eu sei que caras como Richard Christy e Steve DiGiorgio já fizeram lá suas contribuições, mas foi apenas isso: contribuições. Enquanto Matt Barlow estava na posição dianteira do palco, sua presença tinha força suficiente para levar o grupo adiante, mas sua saída foi o evento que fez com que o Iced Earth começasse a declinar. Somando-se isso à já citada falta de identidade de grupo, o que sobrou foi uma formação que pode ser melhor definida como o projeto solo de Jon Schaffer.
Porém, o foco aqui deve ser a época de ouro da banda, que além desse álbum deixou outras excelências para a posteridade, tais quais os discos The Dark Saga e Burnt Offerings. Em Something Wicked This Way Comes, a presença do Iron Maiden já se percebe a partir da capa bem chamativa e, entre as faixas, me parece estar mais escancarada na instrumental 1776. O disco abre com Burning Times, uma música de muita força, que lhe cativa de imediato, e que encontra paralelo nas faixas Stand Alone, My Own Savior, Prophecy, Birth of the Wicked e The Coming Curse. Pelo lado das composições de peso, com direcionamento mais emotivo, algo que eles fazem muito bem, tem as faixas Melancholy, Consequences e, aquela que é uma das minhas preferidas, bem como a primeira canção que me vem à cabeça quando eu penso em Iced Earth: Watching Over Me. É uma música simples, mas bem composta e com um refrão cativante. Um merecido clássico da carreira deles e que vale a pena ser conhecida por quem estiver lendo e ainda não a escutou.

Aliás, vale a pena fazer essa experiência com todo o disco, em uma primeira etapa, e depois prosseguir conhecendo os demais. Se a banda cravou o seu nome dentro desse cenário tão disputado, é porque fez por onde merecer. Se você é dos que acham que os anos noventa foram uma década perdida, faça uma revisão sobre aquele período e veja se, talvez, os seus conceitos não precisem ser reformulados. 

sábado, 20 de fevereiro de 2016



BLACK SABBATH - BORN AGAIN

Mob Rules, a segunda colaboração de Ronnie James Dio com o Black Sabbath, é um clássico, sem nenhuma dúvida, mas fica um pouco aquém de seu antecessor, Heaven and Hell. Os dois são maravilhosos, todo mundo sabe, mas Heaven and Hell vence por alguns pontos a mais. Eu creio que, se Ian Gillan tivesse gravado mais um disco com o Sabbath, muito provavelmente também não superaria ou igualaria o que foi realizado em Born Again. E se quiçá isso tivesse acontecido, não me é possível conceber o resultado, pois aqui se trata de um álbum PERFEITO em letras garrafais! Em seu 11o. disco de estúdio, a banda, pela segunda vez, se reinventou de uma forma surpreendente, trazendo a voz de Ian Gillan, um dos cinco melhores cantores de rock pesado de todos os tempos, ainda no auge de sua forma.
Curiosamente, o próprio grupo não considera esse disco como a pérola definitiva que é e, no exterior, imprensa e público em sua maioria seguem esse pensamento. Parece ser algum desgosto em relação à produção que, de fato, poderia ser melhor, mas a força do material é tão pungente que supera esse tipo de desabor. No Brasil, o disco tem o peso de obra-prima que realmente merece. Born Again é tão denso, tão soturno e carregado de malignitude que atropela de forma definitiva as vãs tentativas de trocentas bandas de black metal espalhadas por aí, tentando ser sombrias.
Na minha preferência, a formação definitiva do Deep Purple é a que traz Ian Gillan à frente. Eu não consigo desassociar sua voz daquela banda e, por isso, percebo algumas alguns traços de purplezices em suas linhas vocais nesse disco, mas são momentos discretos e passageiros. O que Gillan fez aqui foi desafiador. Seus gritos em Disturbing the Priest ajudaram a deixar a faixa mais claustrofóbica e insana do que poderia ter sido imaginada por Iommi, quando compôs o seu riff. O trio de instrumentistas da formação clássica do Sabbath, acompanhada por um vocalista que já possuía o status de lenda fez com que essa encarnação do grupo apresentasse distinções de sonoridade, com elementos que não foram vistos nas outras formações, mas com a linha principal, a identidade, mantida.
Após a abertura com a clássica Trashed, cujo andamento pode ser comparado ao de uma Paranoid mais agressiva, temos, entre vinhetas carregadas de efeito, a já citada Distubing the Priest e, então, a música mais emblemática do disco, Zero the Hero, sustentada na performance de Geezer, executando um riff cíclico, hipnótico, carregando a música nas costas. Na faceta mais tranquila, Keep it Warm, que encerra o disco sem chamar muita atenção, e a belíssima balada gótica, Born Again; no lado mais pesado, dois momentos marcantes em Digital Bitch e Hot Line.

A aura do Deep Purple que cerca Ian Gillan foi o principal fator de dissolução dessa formação, pressionada por críticas dos fãs de ambos os lados, fazendo com que os músicos dessem declarações de que a reunião foi um erro, mas não houve erro nenhum. Born Again, o disco, é um dos melhores discos já produzidos em toda a história do heavy metal. Toda! Pena que não se cometem mais erros dessa natureza.

sábado, 13 de fevereiro de 2016



SMASHING PUMPKINS - GISH

Um grande amigo meu, fanático por Iron Maiden e uma das pessoas mais inteligentes com as quais eu já convivi, me apresentou esse disco. O estranhamento de ver o nome do Iron Maiden dentro de um texto sobre o Smashing Pumpkins é bem próximo do sentimento que eu tive quando recebi o cd para escutar. A típica má-vontade inicial de ter que dedicar tempo e atenção a algo que não fosse metal.
De sorte, eu nunca me furtei a esse tipo de tarefa e, graças a isso, pude conhecer muitas coisas interessantes e, naturalmente,  outras que nem me importo em tentar lembrar. O Smashing Pumpkins está no primeiro grupo e a sua fase inicial, envolvendo esse primeiro album e os subsequentes Siamese Dream e Mellon Collie and Infinite Sadness, estão entre os melhores trabalhos lançados nos confusos anos noventa. Essa é a fase em que a banda era realmente uma banda. O que veio depois deixou claro que o grupo tornou-se o projeto solo de Billy Corgan e apesar de um ou outro pequeno equívoco de trajetória, ainda apresenta saldo positivo em momentos de qualidade. Sua musicalidade atual poderia ser inserida, em uma classificação pessoal, como uma espécie de rock progressivo moderno, ou, numa linguagem mais atual, um pós-progressivo, fazendo par com alguns outros grupos inclassificáveis por natureza, tal qual Tool ou Neurosis…
Gish, por sua vez, soa como geralmente soam os discos de estréia, bem fluidos, com bastante frescor e criatividade. Rhinoceros, por exemplo, é uma faixa belíssima e que tem o curioso poder de diminuir o meu metabolismo. Eu reduzo a velocidade corporea e esvazio a cabeça de pensamentos para poder mergulhar no clima dessa canção. Sensação diversa da que é gerada pelas duas músicas que abrem o disco, I Am One e Siva, mais dinâmicas.
A preguiça mental típica da imprensa é a responsável por associar o Smashing Pumpkins com as bandas de Seattle que explodiram na mesma época. Nada mais errôneo, até pelo fato das influências serem distintas para as duas situações. No caso da banda de Chicago, havia mais traços de psicodelia e de bandas inglesas da cena que gerou o Cure ou o Echo and the Bunnymen, com o diferencial de que nos Pumpkins a distorção de guitarra era mais evidente. Se Billy Corgan merece algum crédito, seria pelo fato de que soube dosar todos os elementos que lhe influenciaram e conseguir gerar um som próprio. O Smashing Pumpkins soa absolutamente único.

Crush, Suffer e Tristessa são da mesma natureza de Rhinoceros, representando a faceta mais melódica e melancólica da banda, fazendo um contraste suave com o lado mais noise, já que, mesmo quando ataca com mais força, como em Bury Me, o Smashing ainda continua soando melódico e melancólico. O som deles mudou aos poucos ao longo do tempo, como eu já disse, mas ainda me instiga a continuar acompanhando sua carreira, porque mudou paulatinamente para algo mais profundo, mais denso, afastando-se de formulas fáceis ou outros artifícios simplórios. Billy Corgan já ameaçou um encerramento de atividades e voltou atrás. Enquanto ainda tiver algo a dizer que continue a se pronunciar. Eu estou interessado em escutar.

sábado, 6 de fevereiro de 2016



WHO - WHO´S NEXT

A menção do nome do Who, colocado em paralelo aos seus conterrâneos e contemporâneos Beatles e Rolling Stones, depende das opiniões do autor sobre a sonoridade da banda. Eu, pessoalmente, considero que eles margeavam o yin/yang formado pelos outros dois grupos ingleses. Basta perceber que, quando lançou seu segundo disco, A Quick One, já surgiam em sua obra as experimentações que os colocavam em paralelo ao que os outros dois estavam fazendo na mesma época, respectivamente nos discos Revolver e Aftermath, mas os álbuns que se seguiram a partir de então – vide o sensacional Sell Out – ampliaram as diferenças existentes entre os três.
O Who, nesse período, estabeleceu um padrão em seus discos, em que cada um, individualmente, já surgia para o mundo com o status de uma peça lapidada e planejada, com começo, meio e fim bem definidos. É o caso de Who´s Next. Sanduichado entre dois álbuns conceituais - Tommy e Quadrophenia – a trinca representa o auge da criatividade da banda e, para quem conhece a forma como o grupo trabalhava, sabe que uma boa parcela desse mérito cabe a um dos membros especificamente.
È fácil perceber que as habilidades de Pete Townshend como guitarrista, embora estivessem bem longe de poderem ser classificadas como limitadas, estavam um pouco aquém dos talentos de seus colegas de banda, mas, por outro lado, o dom do mesmo para a composição era sobrenatural! Neste álbum, por exemplo, apenas a faixa My Wife, de John Entwistle, não tem a sua assinatura. O que sobra é nada mais, nada menos, do que clássicos atemporais como Baba O´Riley, Behind Blue Eyes, Water, The Song Is Over, Won´t Get Fooled Again e a maravilhosa Getting in Tune, apenas para mencionar as mais conhecidas. E mesmo que Pete Townshend não fosse o compositor que é, ter as suas músicas interpretadas por caras como Entwistle, Roger Daltrey e Keith Moon transformaria qualquer melodia, por mais básica que fosse, em algo memorável. A propósito, já que estamos falando em formação, preciso deixar claro que Daltrey e Townshend são grandes ícones, mas Keith Moon e John Entwistle são além de definições. Nasceram um para o outro. Keith era uma força da natureza, um incontrolável espasmo de braços e pernas, cuja explosividade só poderia ser acompanhada por um virtuoso como Entwistle, cujo semblante calmo continha um poder rítmico e uma precisão comparáveis apenas ao modus operandi de Jack Bruce.

Chamar Who´s Next de clássico é, de certa forma, diminuir o seu verdadeiro valor. A palavra “clássico” é, hoje em dia, usada de forma muito aleatória, qualificando qualquer disco que obtenha um pouco mais de destaque midiático, não sendo respeitosa com seu verdadeiro significado. Obra-prima talvez seja um termo mais adequado para esse álbum, pois demonstra o que realmente é o trabalho e não o joga em uma vala comum. Obra-prima de nossa época, uma peça de arte contemporânea desde a capa, que mescla o esotérico com o deboche escrachado. Depois desse disco e de Quadrophenia, viriam lançamentos com inspiração alternada, como By Numbers e Who Are You, que intercalam momentos brilhantes com outros nem tanto, mas a catarse definitiva na carreira, ocorreria com a morte de Keith Moon.Sua ausência teve o mesmo impacto que a de John Bonham no Led Zeppelin e,se por um lado, o Who não encerrou as atividades, a banda que ressurgiu era um mero rascunho da criatura original.