sábado, 26 de março de 2016



CATHEDRAL - FOREST OF EQUILIBRIUM
A coisa mais comum do mundo é um músico, após deixar sua banda de origem, ou simplesmente lançar um trabalho solo, afastar-se do estilo que o consagrou. Poucas vezes, porém, um artista se distanciou tanto daquilo que praticava quanto o fez Lee Dorian, depois de deixar o Napalm Death e estrear com sua nova banda, Cathedral.
O Napalm Death é conhecido pelas músicas curtas e velozes e pelos temas voltados à crítica social, características do grindcore, gênero em que se encaixa. Tirando o vocal gutural – que mais tarde também seria abandonado – tudo aqui é totalmente distinto do que o cantor fazia naquela banda.
Forest of Equilibrium não é simplesmente um disco de doom metal: ele é o superlativo do doom, o doom elevado ao cubo! O clima tenebroso transmitido pelas músicas nos levam a imaginar que os temas por ela narrados se passam naquele universo de seres bizarros da ilustração da capa. É também um momento de transição dentro da carreira de Lee, afinal, ele manteve o gutural que utilizava no Napalm, aplicando-o para canções de extrema lentidão. Mais adiante, ele abandonaria esse tipo de interpretação ao mesmo tempo em que as músicas ficariam com um andamento mais dinâmico, adentrando no que hoje chamamos de stoner metal. A faixa Soul Sacrifice é a única que quebra um pouco o ritmo do disco, mais acelerada – mas não muito – e é, de certa forma, o prenúncio do que a banda iria, com igual brilhantismo, fazer adiante na carreira, explorando cada vez mais fundo as influências setentistas.
Em sua estreia, o Cathedral explorava uma forma de fazer doom que hoje eu já assimilei, mas que me soou muito distinta em sua época. Era o período da explosão do death metal, no começo dos anos noventa, e, embora a banda percorresse outro caminho, a utilização do gutural na voz fazia a ponte entre os estilos. Tirando a já mencionada faixa Soul Sacrifice, todas as demais músicas refletem a autêntica sensação de horror, beleza e angústia que chamaram imediata atenção para o seu começo de carreira. Embora o Cathedral seja mais um dos desafortunados grupos que modificam constantemente sua formação, Lee teve a sorte de manter ao seu lado, de forma permanente, a parceria com o guitarrista Gary Jennings, inclusive nas colaborações criativas. Foi a união dos dois que concebeu esse disco que, goste-se ou não, representou um dos caminhos alternativos que o metal tomou durante as indefinições de estilo do começo dos anos noventa, e que conduziu o Cathedral para o status de referência absoluta do stoner/doom metal, ocupando por direito seu espaço ao lado de monstros absolutos do estilo, como Trouble, St. Vitus e Candlemass. Forest of Equilibrium é um disco que eu tenho o prazer de recuperar, de tempos em tempos, e me deleitar com sua musicalidade.
Embora tenha lançado dois trabalhos históricos com o Napalm Death, a saída de Lee Dorian da banda teve efeito positivo dos dois lados. Barney Greenway foi para o Napalm e tornou-se sua representação definitiva; Lee formou o Cathedral e ajudou a formatar o doom metal, tornando-se referência até os dias de hoje.


sábado, 19 de março de 2016




RAGE - TRAPPED

É estranho que uma banda tão boa, seja tão pouco comentada nas conversas com meus amigos. Aliás, nunca é comentada. Se nos referirmos a ela pelo nome de Avenger, com qual gravou seu primeiro disco, Prayers of Steel, creio que todos vão lembrar e exaltar a mesma. Mas, desde que mudou o nome para Rage, foram gravados dez discos até a época em que parei de acompanhar (o álbum XIII, de 1998). Garanto que esse período correspondeu a uma carreira vitoriosa em termos de qualidade, com discos recheados de canções rápidas, pesadas e com refrões carregados de carisma. Peavy Wagner é um compositor privilegiadíssimo que, felizmente, está do lado metal da força. Se fosse compositor de música pop, com a capacidade que tem de criar melodias, estaria milionário.
A opção de escrever sobre Trapped é quase aleatória, pois a discografia do conjunto é bastante equilibrada. O Rage é daquele tipo de banda que pode se dizer que não tem álbuns ruins. Trapped, portanto, não é mais espetacular do que os outros trabalhos, mas tem uma de minhas canções favoritas que é Baby I´m Your Nightmare e a presença dela no disco desequilibra a preferência na minha aferição. Afora isso, a trinca inicial de canções é absolutamente soberba, pois Shame On You, Solitary Man e Enough Is Enough são clássicos merecidos do repertório do grupo, sendo que essa última é aquele tipo de faixa que você acompanha cantarolando deste a primeira nota do riff.

O Rage pode ser melhor associado a uma terceira entre as principais correntes alemãs de estilos de metal dos anos oitenta. A primeira seria a das bandas thrash, na linha Kreator, Destruction, Sodom e Tankard; a segunda corresponde ao levante de metal melódico liderado pelo Helloween, expoente absoluto, e seguido por grupos como Heavens Gate, por exemplo. O Rage, juntamente com Running Wild e Grave Digger, fazem o estilo de metal tradicional, mas com uma pegada um pouco mais forte. Houve quem chamasse de Power Metal, mas creio que essa nomenclatura não é mais apropriada. É metal tradicional e fim de conversa. No entanto, porque o Rage não se tornou tão popular quanto as outras duas bandas? Creio que parte da resposta está no desempenho vocal. Peavy Wagner é um cantor competente e talentoso para a interpretação de suas próprias composições, mas a sua voz não é tão diferenciada quanto o são as de Rolf Kasparek e de Chris Boltendahl. Afora esse detalhe, o grupo é tão bom quanto os demais e merece um garimpo retroativo por quem ainda não tem intimidade com sua obra. Apesar de ser do tipo de banda cuja formação vive alternando ao redor de um líder, sua configuração mais clássica, em formato de trio com a presença do guitarrista Manni Schmidt e do baterista Chris Ephthimiades, foi a responsável por esse disco e mais outros cinco, correspondendo à sua época mais espontânea, antes de gerar o projeto Lingua Mortis e, com seu sucesso, insistir além do necessário nessa linha. O heavy metal puro e clássico, porém, está bem representado em sua primeira fase e o Rage é, sem dúvida, responsável por alguns dos melhores discos do estilo.

sábado, 12 de março de 2016



QUIET RIOT – CONDITION CRITICAL

No tempo em que tudo que você ouvia tinha que ser true, thrash, black, sombrio, maligno e muito agressivo, haviam apenas duas bandas do então chamado false metal que eu curtia e acompanhava: Motley Crue e Quiet Riot. Hoje, eu aprecio vários grupos que eram objeto daquela infame e datada nomenclatura, como Ratt e Doken, e, sendo muito sincero, ainda guardo algumas restrições por outros, como Keel, por exemplo, mas aqueles dois sempre me despertaram uma parcela de atenção e, por muito tempo, o Quiet Riot recebeu de mim uma admiração especial.
Eu não tenho certeza se o meu primeiro contato foi com o video clip na TV ou se foi com o disco na prateleira da loja. É bem provável que tenha sido a primeira opção, pois o vídeo passava direto em nossas opções de programa pré-MTV e, sendo o caso, quando o álbum foi lançado por aqui, eu já sabia do que se tratava. Eu ainda sequer imaginava que existiam bandas chamadas Slayer, Metallica, Exciter, Venom e afins. Talvez se as conhecesse primeiro, o Quiet Riot teria passado despercebido por mim. Mas era um tempo mais puro, de paulatino descobrimento de bandas pesadas, e por isso a banda nunca saiu de minha memória afetiva.
Para quem não acompanhou o Quiet Riot em seu período de maior popularidade, que correspondeu à época de lançamento de seus dois primeiros álbuns, o grupo é mais lembrado por ter revelado a figura do guitarrista Randy Rhoads. Convenhamos que essa é, de fato, uma sombra enorme lançada sobre a carreira de quem quer que seja, mas sua época com o guitarrista Carlos Cavazo tem méritos próprios e também merece o devido reconhecimento pelo que fez. Se há uma crítica que eu possa registrar, seria pela idéia da banda em incluir um segundo cover do Slade nesse álbum. O cover de Cum On Feel The Noize no primeiro disco foi um dos pontos que alavancou as vendagens do trabalho. É claro que a banda teria liberdade pra inserir, caso quisesse, o cover que entendesse melhor no seu segundo disco, mas um segundo cover da mesma banda do primeiro disco? E na mesma posição da sequência das faixas? Aí, infelizmente, soa como oportunismo descarado...

Mas o disco tem méritos próprios, que vão muito além das estratégias mercadológicas. A capa, muito bem desenhada, traz em seu interior músicas bem carismáticas, que refletem bem o talento de todos os envolvidos, como o são caras como Frankie Banali e Kevin DuBrow, além, naturalmente, do baixista Rudy Sarzo, que já trazia o background de trabalhos relevantes anteriores. Faixas como Sign of the Times, Party All Night, Stomp Your Hands Clap Your Feet, We Were Born to Rock e a balada Winners Take All são o reflexo de um tempo que hoje parece estar muito mais distante no tempo do que realmente é. Não faltam tentativas de reproduzir aquela pegada, aqueles timbres, e tudo o mais que remete a época do apogeu do hard rock americano. Sinceramente, nem deveriam tentar. O Quiet Riot teve o seu momento porque eram aqueles caras, naquele período. Quem viveu, viveu. Quem não viveu, pode desfrutar desse longo e maravilhoso acervo que nos foi legado.

sábado, 5 de março de 2016



THERAPY - TROUBLEGUM

É impressionante como eu gosto desse disco. Não me canso de escutá-lo! Poderia separar um dia, em todas as semanas, para tocá-lo no som do carro e não deixaria nunca de berrar os refrões ou bater a mão na perna, marcando o tempo das músicas, enquanto dirijo. O Therapy é, sem sombra de dúvida, uma banda extremamente desconhecida entre os brasileiros e, já que esse disco, o seu ápice criativo e comercial, é de 1994, pode-se afirmar que o tempo de tornarem-se mais populares por aqui já escoou em definitivo, apesar de ainda estarem em atividade, gravando e fazendo shows.
Embora isso não seja uma atitude exclusiva nova. O grupo irlandês alcançou uma pequena notoriedade, mas não é nada que tenha mudado os rumos da música, o que também não faz com que esse disco seja menos divertido. Não dá pra rotular com exatidão o estilo que o Therapy pratica. Tem um pouco de metal, misturado com doses de punk e rock alternativo, além de algum tempero mais voltado para o pop, como os refrões deixam bem claro.
Troublegum tem uma merecida posição de destaque dentro de sua discografia, que já comporta catorze álbuns. Trata-se daqueles discos que, de tão bons, acabam soando como se fossem uma coletânea. Cada música tem um gancho empolgante, um refrão que lhe puxa pra junto dele. Entre as demais canções do disco, tem uma cover de Isolation, do Joy Division, que, perdoem-me os fãs, comprova uma teoria minha de que qualquer música do Joy Division acaba ficando melhor na versão dos outros do que na de seus próprios autores.
Mas o que importa mesmo, e chama a atenção, é a qualidade das faixas autorais. A produção do disco, que já merece elogios pela forma como conseguiu deixar todos os instrumentos bem altos e límpidos, também acrescenta um ritmo dinâmico na forma como elas vão surgindo no disco, estando o final de algumas praticamente ligado com o início de outras, sem pausa de execução. É dessa forma que, logo após a abertura com Knives, surgem as excelentes Screamager e Hellbelly. Esse álbum tem muitos destaques, mas eu tenho que chamar atenção especial também para as faixas Stop If You´re Killing Me, Nowhere, Die Laughing, Trigger Inside e Brainsaw, todas perfeitas para serem executadas em uma apresentação ao vivo, e, as outras músicas, como Lunacy Booth, Unbeliever, Turn e Femtex, fazem a necessária mudança de climas, em andamento mais pausado, para que o disco possa soar variado. 

Troublegum, do Therapy, é um dos meus discos preferidos, mas é claro que, historicamente, não é um disco definitivo. Não dividiu águas, criou subgeneros ou coisas do tipo, mas é eficiente para mim. Me empolga e isso é suficiente. O que mais eu poderia esperar de um álbum? O legal de Troublegum é que é aquele tipo de disco que você pode indicar para diversas pessoas, e todas elas irão ficar com o pé atrás na hora de fazer a audição. Alguns ainda ficarão indiferentes, mas uma boa parte vai se surpreender e curtir. Eu sei. Foi assim que aconteceu comigo.