sexta-feira, 29 de abril de 2016



GRAVE DIGGER - TUNES OF WAR

Como eu gosto desse disco!
O Grave Digger é aquele tipo de banda privilegiada que não possui álbuns ruins. E é tão esperta que o único trabalho realmente questionável de sua carreira foi registrado com outro nome: Digger, apenas.
Em Tunes of War a banda optou por investir em um lançamento conceitual, o primeiro de sua trajetória, com canções em tons épicos, cheio daqueles corais que caracterizam o estilo, mas sem deixar, um só momento, de soar como Grave Digger, de apresentar o power metal alemão que os revelou para o mundo, capitaneados pelo vocalista Chris Boltendahl que, nessa época, era escudado pelo guitarrista Uwe Lulis e juntos compuseram e produziram o típico disco conceitual perfeito, onde cada música tem vida própria, independente das restantes.
Toda a dinâmica do álbum segue a regra de narrativa cinematográfica, com um início que prende sua atenção, em faixas como Scotland United, The Dark of the Sun e William Wallace (Braveheart), dando uma respirada na parte intermediária, e lhe preparando para o climax, que vai de The Truth até Culledon Muir, tendo como destaque a já clássica Rebellion (The Clans Are Marching). Tunes of War, lançado em 1996, é um disco que você pode esfregar na cara de quem diz que os anos noventa não foram favoráveis ao metal tradicional.
Como eu tenho raiva desse disco!
Não é que o Grave Digger tenha pisado na bola ou coisa do tipo, mas Tunes of War fez tanto sucesso, de uma maneira que a banda ainda não tinha experimentado antes, que virou o canône do que o Grave Digger faria dali por diante em sua carreira. De uma hora pra outra, tudo que a banda lançava tinha que ser conceitual e épico. Tinha que ter refrões grandiosos e coisa e tal. Não era ruim, mas a banda era bastante competente quando fazia seus discos, digamos, normais. A coisa chegou a um tal ponto que os novos fãs receberam um pouco a contragosto os discos posteriores em que a banda praticou sua pegada clássica. Álbuns como o autoititulado The Grave Digger não tiveram vendas tão boas justamente pelo fato de não haver músicas com os climas épicos. É lamentável, porque a banda tem um catálogo excelente nessa sua linha mais tradicional, com discos empolgantes como The Reaper e Heart of Darkness, sem falar, é claro, nos dois clássicos absolutos que são Witch Hunter e Heavy Metal Breakdown. Creio que os fãs mais antigos conseguem conviver bem com esses dois modos do Grave Digger se expressar, mas fãs mais novos, em sua maioria, são alienados em relação aos primeiros anos da banda.
Em síntese:

É óbvio que os questionamentos sobre as diretrizes definidas pela banda não podem recair sobre um trabalho específico. Gostando-se ou não do que o Grave Digger faz, isso não irá macular os méritos de um excelente álbum. O Grave Digger alcançou, com Tunes of War, o ápice de sua popularidade e tem tido a competência de mantê-la estável desde então. Encontraram um nicho em que tornaram-se diferenciados sem perder a própria essência. Em um cenário tão disputado quanto o é o da Alemanha, e sofrendo todas as mudanças de formação que lhe afetam, não é fácil manter-se tão relevante. Que continuem em destaque.

sábado, 23 de abril de 2016



DEMON – NIGHT OF THE DEMON

Existem algumas atitudes alheias que me desanimam. Minha paciência, que a cada ano fica menor, não aguenta mais determinadas posturas, embora eu me cale a respeito porque, afinal, o que cada um opta por escutar ou não escutar não é da minha conta.
Mas, na minha avaliação pessoal, eu entendo que não existe estilo ou corrente musical que seja ruim por definição. E nem boa, diga-se. New (ou Nü, sei lá) Metal não é necessariamente ruim tanto quanto Metal Tradicional não é necessariamente bom.
Talvez eu leve pedradas por isso, mas – e é aqui que eu queria chegar – não é só porque algo é feito sob a sombra das letrinhas NWOBHM que isso vai ser bom, clássico, histórico ou essencial. Não. A NWOBHM foi um momento único, fantástico, que formatou praticamente tudo o que veio depois em termos de heavy metal, mas daí a dizer que todas, absolutamente t-o-d-a-s, as bandas que fizeram parte daquele período são dignas de serem ouvidas ou sequer lembradas, vai um longo caminho.
E pior, quando o assunto é aquele movimento, apenas uma minoria vai citar bandas que não sejam Iron Maiden, Def Leppard ou Saxon, sendo que apenas esta última manteve traços da sonoridade que os revelou. Felizmente, bandas como Grim Reaper, Tygers of Pan Tang, Tank ou Diamond Head são esporadicamente lembrados ou mencionados, mas pouco se recorda de bandas como Raven, Praying Mantis ou Demon, que geralmente demandam uma busca mais profunda dentro da memória da maioria. E não merecem isso. Qual seria a relação dos brasileiros com o Demon se os seus dois primeiros discos não tivessem sido lançados aqui em vinil nos anos 80? Mesmo nossas mais consagradas revistas especializadas não davam muita pauta para o grupo naquele tempo e o fato da banda não ter alcançado o mesmo nível de consagração mundial que aquelas outras obtiveram deixaram-nos na situação de respeito dentro da cena doméstica de sua Inglaterra natal, mas sem atravessar demais as fronteiras europeias.
Fato lamentávl, sem dúvida, mas que não esmoreceu o conjunto, que persiste em atividade até nossos dias, tendo apenas o vocalista Dave Hill como membro permanente. Em sua primeira fase, porém, ele teve o apoio do guitarrista Mal Spooner nas composições e, juntos, criaram canções que mesclavam o metal britânico com uma pegada hard muito evidente, resultando em faixas cativantes com refrões marcantes. Não pense que a dita pegada hard os levou para um caminho similar aquele que foi percorrido pelo Def Leppard. Não foi. O hard que predomina nas composições do Demon tem toda a caracterização inglesa, bem longe de qualquer tentativa de se adaptar para abocanhar fatias de mercado americano. As duas primeiras faixas do álbum, Night of the Demon e Into the Nightmare deixam isso bem evidente, através de melodias carregadas de carisma, que fazem com que a pessoa se sinta naturalmente impelida a cantar junto sem que o frontman tenha que ficar pedindo por isso. Como também não poderia deixar de ser, o onipresente espírito do Judas Priest se mostra bem claro, principalmente na última música do disco, que poderia estar em qualquer dos trabalhos da lenda inglesa.
Night of the Demon, com sua brilhante capa, não é um disco que define o estilo, mas o representa com todos os méritos. Foi lançado há 35 anos e sempre será um prazer fazer a sua audição. A NWOBHM está dignificada aqui.

sábado, 16 de abril de 2016



AT WAR – ORDERED TO KILL

Uma breve narrativa para exemplificar o que é o At War: Motorhead e Venom tiveram um filho juntos, e o bebê nasceu nos Estados Unidos. Pronto.
A partir daí, creio que qualquer pessoa possa fazer sua imagem mental de como essa banda soa. Mas não se prenda ao conceito, porque se o grupo fosse apenas uma imitação de um ou outro dos conjuntos ingleses, eu não me daria ao trabalho de escrever sobre eles. Tem que haver o elemento personal e ele existe aqui. As influências são bem claras, mas a banda agrega seus próprios maneirismos e é, por isso, lembrada por mim até hoje.
Essas associações não são gratuitas, afinal, todos esses conjuntos – e aqui poderíamos também incluir o Sodom - são trios, que fazem música pesada com bastante contundência e tem como figura de frente um baixista e vocalista de aspecto intimidador, sendo tal posto ocupado por Paul Arnold, no caso do At War. A presença do cover de The Hammer não influi nessa comparação, embora a reforce. O At War detem o invejável privilégio de ter lançado dois álbuns impecáveis em sua curta carreira, ter retornado com a mesma formação depois de mais de vinte anos, e concebido mais um disco, igualmente impecável, soando tão bom e relevante quanto o foi em sua origem. Isso é prova de convicção, de quem sabe o que está fazendo e tem objetivos bem traçados e definidos.
Ninguém vai encontrar arranjos mais elaborados aqui. Intros melódicas, dedilhados ou coisas do tipo. A graça do At War está em seu thrash absolutamente cru e direto, amparado pelos temas bélicos que o Sodom só iria assumir como mote bem mais à frente no tempo. Solos são apenas pequenos trechos colocados no intervalo entre os riffs e todo o conjunto parece carregar nos timbres mais graves, reforçando o peso de forma absoluta. O primeiro grande clássico de seu repertório é a faixa título, que inicia o álbum de forma tão contundente que parece que ela está lhe prendendo imobilizado no chão, com o pé em cima de seu pescoço. A mesma impressão é passada também pelas faixas Eat Lead e, principalmente, pela excelente Rapechase. Essa última faixa é a síntese de como o metal deve ser, de como ele deve impactar o ouvinte. É como um esqueleto ao redor do qual ossos e pele se desenvolvem. Rapechase é, portanto, uma música básica, bem exemplificativa do tipo de estrutura padrão a partir da qual podem-se inserir as mais variadas idéias de arranjo e personalizar infinitos modos de tocar metal extremo.
Essas três são os grandes destaques do disco, mas as demais músicas, como Ilsa (She Wolf of the SS), Mortally Wounded, Dawn of Death e Capitulation também merecem menção. Esse disco pode não aparecer nas listas de melhores de todos os tempos, mas merece ser conhecido e estar presente na coleção de qualquer um. Ele é um perfeito exemplar de thrash metal, de um modo que não se faz mais, ou, salvo poucas exceções, quando se tenta replicar soa estranho e datado. Os artigos genuínos estão isentos dessa definição. Nunca soam datados.
Soam históricos.

sábado, 9 de abril de 2016



MERCYFUL FATE – MELISSA

A Dinamarca, não era um país com tradição em heavy metal, ao contrário dos gigantescos mercados americano e inglês, reforçados posteriormente pela emergente Alemanha. Sua própria posição geográfica, entre o território germânico e os demais países do bloco escandinavo, evidencia, em parte, um grau de distanciamento necessário para a formação do som de bandas com personalidade própria: de um lado, a fronteira com um país que vinha crescendo em tradição metálica – carregada de melodia - e, de outro, a proximidade com Suécia e Noruega, que viriam a gerar, no futuro breve, um grande levante de bandas de death e black metal.
Talvez por isso, a música do Mercyful Fate soou tão distinta quando surgiu para o mundo. Junto com o Pretty Maids, ambos foram os primeiros grandes expoentes do heavy metal naquele país, em 1983, mas ao contrário deste último, cujo som navegava em ondas mais tradicionais, as músicas do Mercyful Fate tinham um punch diferenciado, soando completamente diferente de qualquer outra banda do cenário. Mesmo que as influências fossem identificáveis, o Mercyful Fate soou absolutamente único, apresentando uma musicalidade que era tão intrincada quanto cativante. Se o Judas Priest se tornou um gigante, quando em 1980 deixou sua música mais direta, com o álbum British Steel, o Mercyful Fate rumou em sentido contrário, carregando sua música com inúmeros riffs, mudanças de andamento, variáveis tantas que por si só já chamariam atenção, mas foram amplificadas pelo efeito vocal único – e até hoje inimitável – de King Diamond. O que King fez não tinha precedentes e , da mesma forma, não tem imitadores. Ninguém nunca se arriscou a tentar expor alguma influência de seu vocal. Não naquele nível e, pelo jeito, deve permanecer assim.
Tudo isso, que já seria suficiente para trazê-los aos holofotes, ainda foi reforçado pelas letras satânicas, com desenvolvimento mais elaborado do que era até então praticado. Infelizmente a banda implodiu após o segundo – e igualmente perfeito disco – e quando resolveu retornar, teve que amargar um desmerecido segundo lugar nas prioridades de carreira de King Diamond, que obteve mais sucesso de mercado com seu projeto solo autointitulado. Terminar depois do segundo disco, porém, foi influente para que a banda obtivesse o status de cult, de lenda, que hoje detém.
Embora King Diamond receba uma merecida parcela de evidência, é necessário que seja dado um igual destaque para o guitarrista Hank Sherman, afinal ele compôs todas as faixas do álbum, cabendo a King a inserção das letras. Hank Sherman e o também guitarrista Michael Denner, precisaram de  apenas dois discos para marcarem seus nomes entre as principais duplas de guitarra do heavy metal, em um universo restrito onde trafegam membros do Iron Maiden, Judas Priest, Helloween e poucos outros.

O disco Melissa é tão primoroso que, por mais que eu queira, vou evitar mencionar o nome de qualquer uma das canções, pois não há como estabelecer distinções aqui. Tudo é concebido e executado com inspiração extrema. Tão extrema quanto os temas abordados e o maravilhoso contraste que estes causam em meio à tanta complexidade musical e performance.

sábado, 2 de abril de 2016



WHITE ZOMBIE – ASTRO CREEP 2000

Cada vez que eu recupero, aqui nesse espaço, alguma banda caracteristicamente vinculada aos anos noventa, eu vejo que essa época foi, na verdade, muito boa. Não foi explosiva como os anos oitenta, mas gerou bastante coisas interessantes.
É certo que muita parte do que veio à tona no período foi marcado pela fusão de estilos: heavy metal, industrial, punk, rap, progressivo, e sabe-se lá quantas variáveis musicais fundiram-se entre si e geraram os mais diversos híbridos. Se os resultados foram positivos ou não, cabe a cada um dizer, mas vale lembrar que importa mais a abordagem dos artistas do que a nomenclatura do estilo. Nem tudo que é industrial é bom ou ruim por definição. Ou grunge, ou gótico, ou new metal, ou seja lá o quê. Cada banda é, ou deveria ser, seu próprio subestilo.
O White Zombie foi um dos conjuntos mais simbólicos dos anos noventa e desenvolveu uma mistura um pouco complexa, onde música, imagem e temas se confundem para formar o todo. O som é tendente para o metal, e alguns gostam de catalogá-la como industrial. Eu não posso concordar com essa afirmação. Ministry, Godflesh e quetais são industriais, mas White Zombie não. O fato do White Zombie utilizar samplers em suas faixas não é suficiente para defini-lo como industrial, até porque, em sua quase totalidade, os referidos samplers são trechos de filmes antigos ou sons tenebrosos, tudo combinando devidamente com todo o universo de antigos filmes de horror trash, que a banda homenageia não apenas em suas canções, mas em todo o seu conceito visual, rico e magnificamente desenvolvido – e desenhado – pelo próprio Rob Zombie, a cabeça pensante da banda.
Rob Zombie é um artista inquieto, que desconhece o significado de acomodação. Não é à toa que se aventurou em uma bem desenvolvida carreira de diretor de cinema. Não estou dizendo que ele é o ápice da criatividade, até porque ele deve muito do que faz à Alice Cooper, que foi, de diversas formas, pioneiro em algumas formas de apresentar um espetáculo. E, felizmente, Rob não nega essa influência, muito pelo contrário.
Embora tenha lançado quatro discos, o White Zombie só viu o sucesso comercial a partir do seu terceiro álbum. Os dois primeiros ficaram em um estado de esquecimento tanto dentro da discografia quanto do repertório das apresentações, mas o certo é que os dois últimos trabalhos foram marcantes e extremamente inspirados. Em Astro Creep 2000, o peso espontâneo da banda recebeu o reforço extraordinário de John Tempesta, baterista que já transitou pelo Exodus, pelo Testament, e hoje atua no Cult. Além dele, não dá pra deixar de mencionar a participação da baixista Sean Yseult e do guitarrista J., ambos infelizmente desaparecidos do cenário depois que a banda se desfez.
Astro Creep 2000 não é, porém, um disco absoluto. Tem algumas faixas que não fariam falta caso fossem excluídas, mas quando a banda acertava a mão, valia a pena. Super-Charger Heaven, I Zombie, as duas partes de Electric Head e a clássica More Human Than Human são os melhores momentos. O final do grupo foi precipitado, mas felizmente não deixou seus admiradores órfãos. Rob Zombie prossegue até hoje em carreira solo sem distanciar-se um milímetro da proposta que o consagrou.