sábado, 25 de junho de 2016


MACHINE HEAD – UNTO THE LOCUST
Tem épocas que bate um desânimo desgraçado. Tudo parece estar meio morno, sem vida, sobrevivendo apenas no piloto automático. Os medalhões da música seguem ativos, mas lançando discos que são bons e.... e só. São bons mas não impulsionam o gênero para diante, não instigam como faziam no passado. Escuta-se uma vez, duas e esquece-o na prateleira.
Não existe nada de errado com isso, muito pelo contrário, afinal, repita-se, são discos bons, mas de vez em quando é bom receber uma chacoalhada. Ter contato com algo que foi feito pensando-se, como se diz atualmente, fora da caixa. Quando isso acontece proveniente de um artista novo é ótimo, claro, mas para mim a satisfação é quintuplicada quando as viradas de mesa vem de um veterano.
Robb Flynn é a figura central do Machine Head, mas já atua no cenário desde 1985, quando estava junto do Forbidden. Não chegou a gravar o disco de estréia, mas cravou três faixas de sua autoria nele. Formou, na sequência o Vio-Lence, onde ocupava apenas a função de guitarrista, e alcançou o ápice de sua trajetória, como líder de uma banda, no Machine Head.  O álbum de estréia deste último, chamado Burn My Eyes, foi lançado em 1994 e é bem representativo do thrash metal daquela época.

Ocorre que, depois do segundo disco, a banda entrou numa montanha-russa estilística e enveredou com força na tendência nu-metal antes de fazer a guinada para o que está praticando hoje em dia. Nada contra o nu-metal em si, mas ficou claro a tentativa de pegar carona naquela onda, principalmente quando comparamos o resultado dos trabalhos com o dos primeiros discos. De qualquer forma, o que viria depois foi o suficiente para compensar qualquer tipo de pecados. Desde o disco Through the Ashes of Empire que o Machine Head vem num crescendo de técnica, composição e criatividade que chegou às raias do fantástico nesse Unto the Locust. Permitindo-me a liberdade de tentar definir o conteúdo do disco, eu diria que o Machine Head faz prog thrash. Eu creio que a palavra thrash, colocada junto a prog, vai alterar o conceito desta última, principalmente para quem compreende o termo prog em sua forma mais ortodoxa. Me parece, às vezes, que boa parte das pessoas só interpreta o prog, ou progressivo, em seu significado mais reducionista. Ser prog não é apenas fazer viagens instrumentais de 20 minutos, baseadas em conduções de teclado. Ser progressivo significa propor avanços, fusões, experimentações. E o Machine Head, em sua atual fase, veio pródigo nesse sentido, apresentando músicas fortes, pesadas, rápidas, mas também cheias de variações, detalhes e soluções de arranjo que, reconheça-se, mantiveram sua sonoridade noventista mas, ao mesmo tempo, incorporaram elementos atemporais, apresentando-se como um passo evolutivo do thrash metal. Robb Flynn resgatou seu parceiro de seis cordas da época do Vio-Lence, Phil Demmel, e a química entre os dois trouxe o Machine Head até essa atual posição, como uma banda que resgatou um sentimento que vai cada vez mais escasseando em mim: a expectativa e a ansiedade por cada novo disco.

sexta-feira, 17 de junho de 2016



ROLLING STONES – LET IT BLEED
Não se costuma ver, frequentemente, o nome dos Rolling Stones sendo colocados ao lado de seus devidos pares, que seriam bandas como Led Zeppelin, Cream ou Who. Uma boa parte deve discordar, mas essa é a minha opinião. Os Stones não tinham, obviamente, a vontade de mergulhar nas jams instrumentais que caracterizavam as duas primeiras, ou nas viagens temáticas que Pete Townshend desenvolvia para a última, pois o foco do grupo sempre foi o rock´n´roll e o blues. Sim, fizeram várias experimentações no decorrer de seu longuíssimo trajeto, flertando com vários outros ritmos, como reggae e disco music, mas nunca se desviaram da essência. Os Stones, no vinil ou no palco, é uma formação que pode até ser igualada, mas dificilmente será superada.
A trinca de discos que começa em Beggar´s Banquet e termina em Sticky Fingers representa, para mim, o ápice criativo do conjunto. O disco intermediário, conhecido com Let it Bleed, é o meu preferido e, curiosamente, é intermediário também no momento pessoal pelo qual a banda passava. Brian Jones estava saindo e Mick Taylor estava chegando. Os dois participaram do álbum mas nenhum chegou a gravá-lo por inteiro, fazendo apenas pequenas participações em duas músicas cada um. Keith Richards fez, praticamente, todo o trampo sozinho. Eu não me incluo entre as pessoas que, atualmente, elevam Keith a esse status de semideus que parece ter retroalimentado o próprio ego do sujeito, apesar de que ele é realmente genial, mas o fato dele ter tido tal desempenho nesse disco, tão válido para mim, diz muito sobre o guitarrista, se é que tudo já não foi dito.
E não há dúvidas de que os Stones eram uma superbanda. Os comportamentos discretos de Charlie Watts e Bill Wyman eram pouco mais do fachadas para dois músicos excepcionais, donos de talento e bom gosto, e tão importantes para o grupo quanto o são Richards e Mick Jagger. É graças a eles que as introduções de Live With Me e Monkey Man soam tão lindas. Aliás, todos os arranjos desse álbum são algo além do sublime. É dura a tarefa de qualquer música obter destaque em um disco que começa com Gimme Shelter e termina com You Can´t Always Get What You Want, mas o repertório presente mantém no miolo o carisma contido nas suas extremidades, inclusive porque canções como essas não são simplesmente clássicos dos Stones, ou clássicos do rock. Elas vão muito além disso: são clássicos da música universal, são clássicos da cultura humana, que ultrapassarão nossa geração e serão cultuadas e celebradas muito depois que os artistas não estejam mais aqui.
Um exército de músicos colaborou junto com a banda para a realização desse disco, sendo que alguns, como Bobby Keys e Nicky Hopkins, eram parceiros habituais. O mais célebre de todos, porém, era o pianista Ian Stewart, que foi co-fundador do grupo mas, por questões empresariais, mantinha-se à parte dos holofotes que incidiam sob o quinteto principal. A única participação de Ian aqui foi na música que deu nome ao disco e foi a sua atuação que tornou a canção aquilo que é. Desde o respeitoso tom concedido à cover de Love in Vain, de Robert Johnson, até a intensidade de Midnight Rambler, estão explícitos os alicerces que fazem com que a banda ainda seja atuante e relevante. Não nos importemos com o fato de que algumas pessoas encontrem diversão fazendo piadas com a faixa etária dos músicos porque, afinal, se não fosse por esse inevitável fato, eles não encontrariam outros motivos para tecer críticas aos Rolling Stones.

sexta-feira, 10 de junho de 2016



SODOM – AGENT ORANGE

Violência,hostilidade, selvageria, raiva, ódio, fúria, agressão, sangue, morte, guerra, insanidade, malevolência, sujeira, peso, velocidade, heresia, sarcasmo e uma vontade infinita de mandar que qualquer um vá encher a paciência do diabo no mais distante dos infernos.
Pronto. Se terminasse por aqui já poderia considerar a resenha completa. Já teria dito o essencial para transmitir a compreensão do que é o Sodom.
E o Sodom é exatamente isso. É a música heavy metal desprovida de todos os excessos que foram encaixando nela ao longo dos anos. É uma descarga sônica sem gorduras. Não é gratuito o fato de que os subestilos mais extremos, como o black metal e o death metal, devam um tributo imenso aos caminhos que o Sodom pavimentou. Mas Tom Angelripper não é o tipo de sujeito que fica arrotando sua influência por aí. Ser influente, ser um dos criadores de novas vertentes do metal, não o mudou e nem mudou sua banda. Ele é o típico sujeito de postura largadona, que acende um cigarro, pega uma cerveja e bota os pés em cima da mesa, antes de subir no palco e mostrar aos neófitos de onde veio a brutalidade do metal atual. Ouvir um disco do Sodom faz com que você esqueça que existem coisas mais extremas por aí, pois, em grande parte dos exemplos, essas se empenham tanto na corrida pra ver quem é mais rápido e pesado que acabam minimizando o fator carisma em suas composições. E, não raro, o carisma reside justamente naquelas músicas que são mais voltadas para o básico.
 A palavra coerência não foi utilizada lá no primeiro parágrafo, mas cabe como uma luva em relação à banda, pois, desde seu primeiro EP até o mais recente disco, a mudança mais evidente é a de produção, mas não de pegada ou estilo. Não considero que Agent Orange seja essencialmente superior ou inferior aos demais discos, ele segue o mesmo padrão, e, embora as constantes mudanças de integrantes dificultem apontar que o Sodom tenha tido uma formação clássica, a que se fez presente aqui pode cumprir esse papel, pois além do líder, Angelripper, tinhamos também o baterista Witchhunter, presente desde o início da banda, e o guitarrista Frank Blackfire, que depois teria uma passagem pelo Kreator.
Algumas das faixas mais emblemáticas da carreira da banda estão nesse disco, como a própria Agent orange, a excepcional – e uma de minhas sempre favoritas – Remember the fallen, a mais do que clássica Ausgebombt, e a também excelente Tired and red.  Baptism of fire e Magic Dragon também merecem ser mencionadas, sendo que essa última, apesar do título, não tem nada a ver com temáticas de power metal, referindo-se a um modelo de avião que foi utilizado na guerra do Vietnã.  
O Sodom, tal qual os demais baluartes do thrash alemão, está mais forte do que nunca e parece que tão cedo não irá pendurar as chuteiras. Que assim seja, pois naqueles períodos em que as coisas parecem estar estagnadas e sem ânimo, sempre iremos precisar de uma música que traga violência, hostilidade,selvageria, raiva, ódio, fúria,...

sábado, 4 de junho de 2016



JUDAS PRIEST – HELL BENT FOR LEATHER

Novamente se trata daquela benção, de possuir um catálogo tão privilegiado, que qualquer pessoa tem que refletir um pouco antes de nomear qual é o disco mais clássico entre os outros clássicos. Ter um acervo onde até os trabalhos menos inspirados ou mais polêmicos são essenciais e relevantes. Hell Bent For Leather, juntamente com Stained Class, me passam a impressão de serem meio como pérolas perdidas dentre a discografia da banda. Qual o melhor disco do Judas Priest? Rapidamente alguém vai citar British Steel, Screaming for Vengeance, Painkiller, Sin After Sin ou algum outro, mas aqueles dois são pouco lembrados no momento de uma resposta mais imediata. Não descarto a possibilidade de que essa seja uma impressão equivocada, sob uma ótica brasileira, gerada pelo fato desses dois álbuns terem sido lançados muito tardiamente por aqui.
Hell Bent for Leather é o álbum que fecha o ciclo dos cinco discos lançados antes do ao vivo Unleashed in the East, que antecede o lançamento de British Steel e faz a divisória entre o Judas dos anos 70 e o dos anos 80. Eu sempre considerei a obra do Judas Priest como algo muito coeso. Não existem oscilações extremas de identidade. Do Turbo ao Painkiller, de Sad Wings ao Defenders, tudo soa como Judas Priest. A presença de Rob Halford, vocalista-mor do heavy metal, e o trabalho siamesco desenvolvido por Glen Tipton e K. K. Downing são selos que revelam não apenas a personalidade da banda, mas as bases que fundamentam todo o estilo. Se o Judas passeou com desenvoltura do hard quase glam de Turbo até o thrash de Painkiller, é porque os artistas mais emblemáticos desses subestilos já utilizavam elementos da banda inglesa em suas composições.
Hell Bent for Leather foi lançado em 1978, mas é o disco menos setentista de seu período. Em termos de desempenho, o disco antecede, quase como um prólogo, o que seria apresentado em British Steel, com faixas mais concisas e diretas, além da variedade intrínseca. A formação era a que continha o praticamente inalterado quarteto, com o acréscimo do baterista Les Binks, cuja passagem pela banda desenvolveu-se justamente no período dos três discos entre Stained Class e Unleashed in the East .
A faixa título é a grande sobrevivente do repertório do álbum, nos setlists dos shows, seguida esporadicamente por The Green Manalishi, mas como seria prazeroso se eles ainda pudessem encontrar espaço para executar clássicos como Running Wild ou Delivering the Goods. Há um forte gancho na melodia de faixas como Evening Star, Take On the World, Rock Forever e da balada Before the Dawn, colaborando para o potencial de vendas do disco, sem que o mesmo descambe para o mero comercialismo, e balanceando com o clima mais hard setentista de músicas como Killing Machine, Burnin Up e Evil Fantasies.
Quando eu comecei a escutar heavy metal, o Judas já era uma lenda. Do ano de sua estréia até o British Steel, passaram-se seis anos, que totalizaram seis discos de estúdio. Às vezes eu fico imaginando como deve ter sido a experiência de quem acompanhou o conjunto em sua época, comprando os discos no momento de seu lançamento e vibrando com o fato de que cada um era melhor do que o outro. Não seria diferente da experiência que tive com Metallica ou Slayer, que de certa forma foram meus contemporâneos, mas esses últimos, embora inaugurassem a linguagem thrash, nasceram sob a égide de uma cultura heavy metal já estabelecida.
Na época do Judas, eles estavam criando essa cultura.