CENTÚRIAS – NINJA
Para quem não é de São Paulo e acompanhou à distância, mesmo dentro de
seu próprio país, a evolução do cenário de bandas de heavy metal, a sensação é
de que houve uma rápida queima de etapas no Brasil. Mal surgiram – ou, melhor
dizendo, mal tornaram-se conhecidas – as bandas de metal clássico, as vertentes
mais extremas já estavam mordendo seus calcanhares. Para cada Harppia e Salário
Mínimo que estavam despontando, já havia um Korzus, Vulcano ou Sarcófago. Isso,
repito, é a minha interpretação vista de longe. Para os conterrâneos desses
grupos, que os acompanharam de perto, desde a época das demo tapes, a transição
deve ter sido mais natural, obviamente.
A consequência disso é que o metal tradicional pátrio não foi
adequadamente absorvido por aqui. Existiram grandes trabalhos e o devido
reconhecimento lhes foi dado, mas poderia ter sido bem mais.
Ninja, primeiro álbum do Centúrias, é um exemplo concreto. É, de longe,
um dos melhores discos de metal cantados em português e teve a missão de
suceder, após uma reformulação geral na formação, o excelente EP de estréia da
banda. O grupo que contava com o vocalista Eduardo Camargo à frente deixou
saudades, mas o remanescente baterista Paulo Thomaz teve bala na agulha pra
trazer dois ex-integrantes do antológico Harppia e o vocalista César Zanelli,
que já tinha passado pelo Santuário. Com um time desses, composto apenas por
pessoas que já conheciam muito bem do riscado, não tinha como dar errado: Ninja
é um disco forte, coeso, com músicas maduras e muito bem desenvolvidas. É
aquele típico caso de disco que, de tão bom, sustentaria sozinho o repertório
de uma apresentação.
Tendo sido lançado em 1988, sua chegada ocorreu num momento em que o
thrash já era uma corrente consolidada, mas tirando um pequeno flerte aqui e ali,
o clima todo é de puro e vigoroso metal tradicional, sendo que em diversos
momentos podemos identificar uma influência muito forte de Saxon, especialmente
nas músicas Guerra e Paz e Metal Comando. Talvez a diferença do timbre de voz
de César Zanelli dificulte um pouco essa identificação, mas se prestarmos
atenção apenas na levada da música, veremos que ela é bem calcada na lenda
britânica e isso é bastante louvável, pois, embora o Saxon seja bastante
cultuado por aqui, seu legado ainda não foi suficientemente explorado pelos
grupos nacionais.
E, falando de influências britânicas, o onipresente Judas Priest não
poderia faltar. Arde Como Fogo parece ter sido composta depois de uma intensa
sessão de audição do álbum Hell Bent For Leather. Paulo Thomaz tem um
desempenho ímpar, tanto nessa música quanto no resto do álbum. É um músico com
longa trajetória no cenário brasileiro e merece ser bem mais reconhecido, mas o
seu trabalho em Ninja é como parte de uma verdadeira equipe. Não há um músico
que se sobressaia ou que chame mais atenção dos que os demais ao longo da
audição. É uma banda na acepção mais pura da palavra, composta por verdadeiros
amantes do estilo que fazem. Não à toa, apesar de ainda sofrer as inevitáveis
mudanças de formação, continua ativa e relevante. Centúrias é a história viva
do metal brasileiro em cima dos palcos.
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