domingo, 26 de abril de 2015



SAXON – WHEELS OF STEEL

A Inglaterra é considerada a pátria-mãe do heavy metal. O Saxon, talvez, nunca tenha chegado ao status de maior banda do estilo, mas, para mim, não existe nenhuma banda, de rock pesado ou não, que seja mais associada ao território bretão. Mesmo considerando Beatles, Kinks, Iron Maiden, Sex Pistols, Clash, Led Zeppelin e outras, considero o Saxon como a mais inglesa de todas bandas.
O motivo para isso eu não sei. Talvez seja a associação, feita na juventude, entre o nome – Saxão – e os livros de história, que esclareciam que aquela era uma tribo que iria, juntamente com os Anglos, formar o que viria a ser, séculos depois, o reino da Inglaterra.
Tendo surgido no levante de bandas que ficou conhecido como NWOBHM, o Saxon nunca se afastou essencialmente da sonoridade que caracterizou aquele momento. Se o Iron Maiden se tornou a maior banda do movimento, e, na sequência, a provável melhor banda de todo o heavy metal,gradualmente distanciando-se do som que fazia em sua origem, o Saxon fincou os pés em suas características e é a maior banda dentre as poucas que ainda soam essencialmente como NWOBHM. Teve altos e baixos criativos, é claro, como qualquer grupo com tanto tempo de estrada, mas não tem nenhum disco especificamente ruim, nenhum disco experimental. São a pura essência do peso britânico.
Escolher Wheels of Steel, para falar sobre, não foi uma decisão fácil. Nem sei se seria a mesma em outro dia ou outro momento. Wheels of Steel e os dois discos que vieram em seguida, Strong Arm of the Law e Denim and Leather, são, para mim, uma das mais coesas trilogias já feitas. Discos trigêmeos, lançados no espaço de tempo compreendido entre um ano e cinco meses. Há tantas semelhanças entre eles que não admira que tenham sido a base do repertório que gerou, logo em seguida, um dos melhores discos ao vivo de heavy metal: The Eagle Has Landed.
Tal qual suas contemporâneas, o Saxon fundiu a agressividade do punk, combinando velocidade motorheadiana e linhas melódicas de guitarra, inspiradas no que já vinham praticando bandas como Judas Priest e UFO. Na tendência dessas últimas referências mencionadas, temos, no disco, as maravilhosas 747 (Strangers in the Night) e Suzie Hold On. Pelo lado das primeiras, praticamente todo o restante: Motorcycle Man, Street Fighting Gang, Machine Gun, Freeway Mad, Stand Up and Be Counted, See The Light Shining  e Wheels of Steel são músicas para exercício de vértebras cervicais. A banda, em seus anos iniciais, com sua primeira formação clássica, já soava entrosadíssima.

O reconhecimento da influência do Saxon deveria ser mais exposto, mais declarado, mas dizer que é influenciado por eles é o similar perfeito da frase “eu toco heavy metal” e, portanto, sua projeção salta mais aos olhos nas bandas que se empenham em executar o estilo na sua forma mais pura. Bandas como Exciter, Running Wild, Armored Saint e até novatos na cena, como o Enforcer, prosseguem com o legado do gigante insular que ainda está de pé, dando sangue, longe de pensar em se deitar sobre seus louros, mas construindo novos alicerces para a música que ajudou a consagrar.

domingo, 19 de abril de 2015




BODY COUNT – BODY COUNT

Misturar estilos é sempre perigoso e arriscado. A tendência purista de quem é aficcionado por música tende a levantar barreiras contra quaisquer tentativas de subverter os dogmas de seus gêneros musicais preferidos. O que se poderia dizer, portanto, da tentativa de unir rock pesado com rap? Living Colour, Rage Against the Machine e Beastie Boys transitaram por essas experimentações e o Anthrax brincou um pouco com a idéia em uma ou duas músicas lançadas em EPs, mas ninguém foi tão agressivo quanto Ice-T e o seu Body Count.
Ice-T já era um músico consagrado dentro do seu estilo que, por sinal, corresponde à facção mais agressiva dentro do hip-hop, o gangsta rap. Desconheço suas raízes dentro do rock, o que ele ouvia quando era mais jovem ou coisas assim, mas reconheço que ele foi muito bem sucedido em sua empreitada, porque não se meteu a querer reinventar a roda. O primeiro álbum do Body Count é um disco de punk rock bem cru. Não tem nenhum grande instrumentista entre os músicos e, portanto eles vão direto ao ponto, direcionando ao som básico e acertando no alvo. Arrisco até a dizer que, fora o timbre da voz de Ice-T, rapidamente associado ao seu estilo de origem, pouco vai ser encontrado de rap aqui.
Até a capa, se for bem observada, não se afasta do estilo de capa tradicional utilizada por bandas de heavy metal. Basta imaginar Conan nascendo em um gueto de Los Angeles, sendo membro de gangue e trocar a espada pelo revólver. Pronto. Está formatado mais um disco extremamente representativo de sua época, os anos noventa, onde misturas foram priorizadas, mas as tradições foram mantidas. Em 1992, ano em que esse álbum foi lançado, vieram também ao mundo obras importantes de bandas como Megadeth, Pantera, Iron Maiden, Dream Theater, Alice in Chains, Ministry, Black Sabbath, Manowar, Fear Factory, Kyuss, Napalm Death, WASP, Faith no More, Kiss e Tiamat. Ou seja, há algum exagero na forma como essa década é vista, porque opções eram abundantes e sortidas.
O disco é repleto de pequenas vinhetas, tratando, em geral, sobre situações de racismo. A primeira música, Body Count in the House, soa mais como introdução, pois, quando a faixa-título, Body Count, começa, o disco mostra ao que veio. Baseada na marcação da bateria, a música lhe puxa pra acompanhar o refrão! Mais uma vinheta e surge uma faixa mais rápida, Bowels of the Devil. Excelente!
Eu não posso me omitir de mencionar Cop Killer. Sem entrar no contexto polêmico de sua letra, a música – em sua essência – é apenas legal, sem nada de mais. Por conta da censura sofrida, ela foi omitida da prensagem inicial do álbum, mas, sinceramente, nem faz tanta falta. O disco está repleto de várias outras músicas bem melhores, tal qual, por exemplo, KKK Bitch, a pesadona Voodoo, a power ballad The Winner Loose e There Goes the Neighborhood, com sua ótima letra, como teria realmente que ser, para quem é egresso de um estilo tão fundamento na construção destas.

Quando eu conheci o disco, lá atrás no tempo, tive um estranhamento inicial. Natural, porque os ouvidos, calejados com outra sonoridade, levam um tempinho para assimilar. Hoje, já nem percebo mais. Escutei tanto esse álbum, ao longo dos anos, que atualmente ele me soa apenas como o que tem que ser e é: um disco de rock pra ouvir no máximo!

domingo, 12 de abril de 2015



HELLOWEEN – THE TIME OF THE OATH

A concepção da obra-prima deve ser o melhor acidente de percurso na trajetória de uma banda. Ter o seu talento reconhecido, retratado em um momento específico da carreira onde tudo convergiu para a criação daquele álbum que, doravante, permanecerá perpetuado no seleto grupo de obras consideradas clássicas.
Mas o que deveria ser júbilo acaba, por vezes, tornando-se transtorno. O mesmo fã que consagra é aquele que constrange e delimita a carreira de seus ídolos. O álbum inovador finda por tornar-se uma prisão criativa e as pessoas começam a cobrar por um novo Bonded by Blood, um novo Painkiller, um novo Reign in Blood, um novo Master of Puppets, deixando de dar o devido reconhecimento a discos seguintes, que são diferentes, mas tão bons quanto os consagrados.
O Helloween fez a saga Keeper of the Seven Keys e disparou para o topo do cenário do heavy metal. Revelou um grande vocalista e criou uma sequência de canções que eternizou seu nome, além de dar origem a uma leva de seguidores, que estudaram e – isso não é necessariamente positivo – reproduziram suas idéias. Mas o que importa é que os Keepers já foram feitos e ponto final. A banda não os refez com outro nome. Criou dois novos discos que são, sim, muito bons, e que, até na arte das capas, afastaram-se um pouco dos conceitos fantasiosos que fizeram sua fama.
Mas não eram os Keepers.
E, mais na frente, no futuro próximo, um pecado ainda maior: Michael Kiske está fora.
A banda tomou o rumo adequado e se reconstruiu. Sabiamente, trouxeram um novo vocalista que não tinha nada a ver com seu antecessor. Tudo bem, Kiske era um mestre em sua função, mas as relações internas se deterioraram e ele saiu. Paciência, vamos andar para frente e tentar algo novo, pois emular o passado seria cair no pastiche.
 Ah, mas o vocalista novo tem voz de hard rock e não alcança as notas que Kiske alcançava… Dane-se! Onde está o maldito livro de regras que delimita os caminhos que uma banda escolhe seguir? E porque razão essa banda deveria virar imitadora de seus imitadores? Nada disso! A banda apostou no que tinha em mão e se deu bem. Lançou um primeiro trabalho ainda um pouco acanhado, Master of the Rings, mas, na sequência, pegaram impulso e lançaram um de seus melhores discos: The Time of the Oath.
Basta ouvir. Trata-se de uma fantástica sequência de músicas em que cada uma soa individualmente como um clássico. É o tipo de disco que pode ser tocado na íntegra em um show especial. Desde a abertura com uma faixa curta e bombástica como We Burn, passando pelo metal tradicional de Steel Tormentor e pela inusitada Wake Up the Mountain, chega-se até o, provavelmente, maior clássico da fase Andi Deris: Power. Uma música melódica, curta e direta, uma faixa tão importante, carismática e essencial dentro da carreira da banda tal qual o são Ride the Sky ou Eagle Fly Free.
Depois dessa perfeita sequência de quatro canções, vem uma balada para dar uma variada no clima, mas mantendo o nível do disco ainda no alto, pois Forever and One é uma das melhores – se não a melhor – faixa desse estilo já feita pelo Helloween.  Em seguida, a banda volta a carga com bastante agressividade em Before the War, fechando uma espetacular marca de seis faixas seguidas com absoluta perfeição.
Após toda essa catarse, o Helloween pôde se dar ao luxo de incluir algumas músicas de menor impacto, mas, entre as restantes, tem que se dar destaque ao hard rock de Anything My Mama Don´t Like, as faixas tipicamente helloweenianas Kings Will Be Kings e Mission Motherland, repletas de solos e passagens mais elaboradas e, por fim, a soturna faixa-título, The Time of the Oath, que encerra o disco em padrão altíssimo.

Andi Deris, se consagrou e firmou seu lugar na banda, independente de ainda haver viúvas do seu antecessor. Kiske e Deris, cada um, a seu modo, são excelentes e realizaram trabalhos insuperáveis dentro do Helloween. A banda prossegue, alternando acertos e erros, mas olhando para a frente, sempre um passo a frente de seus eternos clones.

domingo, 5 de abril de 2015



BLUE OYSTER CULT – SECRET TREATIES

Eu não consigo compreender muito bem porque é que alguns fãs de rock – ou de música, no geral – fazem tanto esforço pra autolimitar suas opções de fruição. Prendem-se tanto a um determinado estilo, ou a um numero específico de artistas e não se interessam em conhecer outros trabalhos, presentes, futuros ou antigos. É a lamentável postura do “não ouvi e não gostei”
Ouvir algo apenas uma vez e fechar um veredito de opinião também não é muito recomendável. A absorção de alguma obra pode depender do momento que você está passando. Óbvio que eu falo apenas sob minha perspectiva e o que serve pra mim não funciona pra outrem, mas foi assim que aconteceu comigo em relação ao Blue Oyster Cult. Escutei algo da banda esporadicamente, aqui e ali, e não me interessou muito. Um dia, porém, a música soou de outra forma e eu fiquei com aquela sensação de “onde é que eu estava com a cabeça antes?”. Não há explicação pra isso. Simplesmente acontece. Foi o momento certo.
Talvez o erro tenha sido tentar conhecer a banda através de uma coletânea. Geralmente, é um ótimo cartão de visita, mas nem sempre soa adequadamente. Determinadados discos precisam ser ouvidos na íntegra. Determinadas discografias merecem ser conhecidas na sequência.
Esse disco, Secret Treaties, por exemplo, é tão bom que você vai elegendo suas músicas favoritas conforme elas são apresentadas, e, no final, você não consegue mais separar uma das demais do conjunto. A primeira faixa, Carrer of Evil, é um típico hard americano do começo dos anos 70 e fica na sua cabeça por todo o resto do dia. A mesma representa uma autêntica colaboração entre os músicos da cena novaiorquina, já que a música do BOC permeia uma letra da grande poetisa punk daquela metrópole, Patti Smith. Eric Bloom, que canta a maior parte das músicas, tem uma voz excelente para o estilo. Está mais para o suave do que para o agressivo e chega até, em alguns momentos, a lembrar o timbre de Bob Dylan, como transparece em certos trechos da segunda música, Subhuman.

Ao longo de todo o trabalho, o Blue Oyster Cult passeia por sua mescla de metal, hard e progressivo, que, guardadas as individualidades mais herméticas, coloca a sonoridade do grupo como uma espécie de versão norteamericana do Uriah Heep, havendo similaridades inclusive na parte lírica, dada a predominância pelos temas místicos. Dominance and Submission prossegue com a variedade do repertório e é seguida por ME 262, que, para quem não sabe, é o modelo do avião que está na capa do disco. Depois de Cagey Cretins e Harvester of Eyes, o disco encerra com dois clássicos indispensáveis: Flaming Telepaths e Astronomy. Dois momentos absurdamente divinos. Duas faixas cuja vibração mescla-se com a beleza, daquela forma que faz com que você tenha vontade de entoar cada verso com ênfase. Não faltam bandas no universo para serem conhecidas. Existem aquelas que ultrapassaram os conceitos de gigantismo e existem aquelas que – justa ou injustamente – nunca se erguerão para além dos nichos. Na interseção, estão as bandas que tenham feito – ou ainda façam – sucesso, conceberam algo tão único que o tempo e as tendências vão passar, mas o nome delas sempre será lembrado e cultuado. Assim é o caso do Blue Oyster Cult. Minha opinião não deve ser de grande valia, mas se por um momento puder ser levada em consideração, ouça esse disco, conheça essa banda. Mesmo que você não goste, vai pelo menos ter vivenciado um pouco do que os seus ídolos desfrutaram em suas juventudes, os discos que eles escutavam quando estavam aprendendo a tocar.

domingo, 29 de março de 2015



BLACK SABBATH

Em fevereiro de 1970, eu tinha um ano e meio de idade. Não imaginava que eventos que seriam tão significativos em meu futuro estariam ocorrendo tão distante de minha realidade, kilômetros e kilômetros atravessando o Atlântico.
Nesse intervalo de tempo, toda uma história de vida se constrói. O mundo e suas relações geopolíticas se modificaram centenas de vezes. Guerras começaram e terminaram, mapas foram alterados, a história seguiu seu percurso.
E a arte também. A música, mais especificamente, viu nascer e morrer diversos estilos ou tendências, além das próprias formas de sua fruição.
Mas o Black Sabbath permanece.
Sofreu, também, efeitos da passagem do tempo, mas permanece.
E continua relevante. As pessoas ainda param pra ouvir o que o Black Sabbath está fazendo. Da pequena bandinha de botecos até se tornar influência e, por fim, ocupar o zênite de músicos acima do bem e do mal, de artistas que transcenderam conceitos e tornaram-se definições, adjetivos. Sabbathico.
Porém, o mesmo tempo que louvamos por conduzir o Sabbath até onde chegou é o tempo que amaldiçoamos por tirar nossa ingenuidade e esvanecer nossas impressões. A música do Black Sabbath transmitia medo. Era palpável. Foi assim que eu o percebi nos primeiros anos de doutrinação metálica, quando eu era ignaro em relação a todos os conceitos da arte heavy metal. O efeito daquelas três notas da música homônima, o trítono proibido e emoldurado por tambores soturnos assustava. Música não deveria ser algo para falar de amor e alegria? Não era isso que a nossa cultura informava? De repente, conhecer algo, uma melodia, que soava tão estranha e deslocada daquilo a que estavamos acostumados, nos fazia voltar as agulhas para o começo várias e várias vezes, em um misto de fascinação e curiosidade, com o silêncio e a concentração típicas de quem está assistindo um filme de horror, sozinho, à noite.
Por diversas vezes, já li em entrevistas que apenas a formação original é capaz de executar as músicas dos primeiros discos de modo correto. E eu concordo. Correto, aqui, não significa a afinação perfeita ou o tempo das músicas. Significa a interação única entre aqueles quatro ingleses. A influência que a respiração de cada um tem no andamento das faixas. Muito se diz que Bill Ward seria mais um percursionista do que um baterista e eu também estou de acordo. O seu desempenho, principalmente nas duas primeiras músicas, cujos riffs deixam bastante espaço pra preenchimento, escancara isso. A voz estranha de Ozzy, o anti-Robert Plant, atuando como elemento essencial do arranjo, e a interação única entre as cordas de Tony Iommi e Geezer Butler, completam esse autêntico conjunto. Bandas existem aos montes, mas conjuntos - conjunção de características que se mesclam e se completam resultando em uma unidade ímpar – existem poucas, e o Black Sabbath original é uma delas.
Como é típico dos álbuns de estréia dos grandes nomes, lançados naquele tempo, esse aqui contém números que se consagraram para a eternidade, como Black Sabbath, The Wizard e N.I.B., covers, como Evil Woman, e experimentação, como a dobradinha Sleeping Village e Warning, sendo essa última repleta de momentos zeppelinianos (outro adjetivo).

Tudo que eu falei até agora não alcança uma ínfima parte do que eu gostaria de dizer ou do que eu sinto sobre esse disco e essa banda. Mesmo que eu continuasse a escrever, não chegaria em momento algum a um final que fosse satisfatório. Recentemente, eu estive em Santiago e fui conhecer o bar Hard Rock Café de lá. Havia, exposta no local, uma guitarra do Tony Iommi. Uma Gibson preta com as marcações em forma de cruz. Creio que eu passei uns cinco minutos parado, em silêncio, olhando pra ela. O que eu senti, naquele momento, as palavras que eu não verbalizei, são as mesmas que eu usaria para concluir esse texto. 

domingo, 15 de março de 2015



KROKUS – HEADHUNTER

No mundo do show business é tênue a linha entre o sucesso e o esquecimento. Longe de mim dizer que o Krokus pertence a esse último grupo, mas a exposição que o grupo tinha, nos primeiros anos da década de 80, levava a crer que eles teriam mais popularidade do que detem hoje. O Krokus era uma banda em rápida ascensão, que fazia bastante sucesso. Hoje, é, infelizmente, pouco lembrada.
As razões para que isso tenha acontecido eu desconheço, mas arrisco um chute: a tentativa de abarcar uma fatia maior do mercado norte-americano, direcionando o som e o visual para o campo do glam metal. Nada contra o estilo, mas uma coisa é nascer glam metal e outra, bem diferente, é querer virar glam. O Krokus já tinha uma identidade sonora e visual, fazendo um rock visceral, ríspido e cru. Investir nesse tipo de redirecionamento, naquela altura da carreira, levando-se em conta que a época coincidiu com o advento do thrash metal, talvez não tenha sido a melhor estratégia.
O status do Krokus é, em parte, semelhante, ao do Scorpions: pioneiros do rock pesado em uma nação sem tradição no gênero. Ao contrário, porém, da proliferação de bandas germânicas que o tempo revelou, a Suiça, pequeno país encaixado entre a Itália, Alemanha, França e Austria, não foi tão fértil na geração de artistas relevantes dentro do estilo. Fora o Krokus, apenas o Coroner, o Samael, e o Celtic Frost – com suas encarnações Hellhammer e Triptykon – obtiveram algum destaque no cenário internacional.
Headhunter é, portanto, o ápice do desempenho do Krokus em estúdio. Uma observação constante que se faz em relação à banda é o que se refere a sua fortíssima influência de AC/DC. De fato, em alguns momentos de sua discografia, essa marca é tão presente que chega à beira do incômodo. Não que eu não goste da banda australiana, mas é porque só existe um AC/DC e o Krokus sempre demonstrou talento suficiente para desenvolver uma sonoridade própria. Headhunter comprova isso.
A primeira música, que leva o nome do disco, já nasce como clássica. Um arrasa-quarteirão, começando com uma levada de bateria, em ritmo locomotiva, acompanhada de um baixo pedal. Talvez a pegada mais agressiva desse disco possa ser, em parte, creditada ao produtor Tom Allon, que tem uma longa folha de serviços prestados junto ao Judas Priest. Rob Halford inclusive aparece, fazendo backing em Ready to Burn. Mas os méritos maiores são mesmo da banda, que tem o seu núcleo principal no vocalista Marc Storace e nos guitarristas Mark Kohler e Fernando von Arb, o principal compositor do grupo.
A faixa seguinte, Eat the Rich, é apenas legal. Parece que ninguém consegue fazer alguma música realmente boa com esse título. Felizmente, a próxima, Screaming in the Night, é uma grande canção. Um número de peso com emoção que soa como um cruzamento entre Kiss e Accept, nos momentos em que eles investiram nesse tipo de melodia. Essa é a única faixa do disco que continua presente nos setlists e assim merece permanecer.
A já citada Ready to Burn é a inevitável presença acdciana no disco. Night Wolf e Stand and be Counted são típicos exemplos de metal do comecinho dos anos 80. Entre elas, temos um cover de Stayed Awake All Night do Bachman-Turner Overdrive, que não acrescenta muito. Chegando ao final tem White Din que é apenas uma vinheta, mas que insinua a chegada de algo impactante e, de fato, a próxima faixa – a última do disco – é Russian Winter, que só não é melhor porque é amaldiçoadamente curta. Ela termina e você fica com a sensação de que ela poderia, facilmente, ser mais desenvolvida. Mas isso não desmerece a mesma.

Da mesma forma, o caminho que o Krokus tomou a partir desse álbum não o desmerece. A banda continua ativa e fazendo bons discos. Não vai conseguir, a essa altura, recuperar a trajetória ascendente que vinha percorrendo. Mas quem se preocupa com isso?

domingo, 8 de março de 2015



TANKARD – BEST CASE SCENARIO

Guitarra, guitarra, guitarra… Só se fala em guitarra e no seu impacto para o desenvolvimento do rock. Tá certo que esse instrumento tocado por alguns egocêntricos tem o seu valor e importância indiscutíveis, mas – grande injustica – pouco se lembra de outro elemento tão importante quanto – se não mais – para que o rock chegasse aonde chegou:
A cerveja!!!!!
Quantas bandas não foram formadas sob as bençãos do divino líquido, quantos ensaios não foram regados por ela, quantos riffs não foram criados sob sua influência? Quantos shows, festivais, reuniões de fãs não ocorreram com o seu consumo??? A cerveja é onipresente na cultura do rock´n´roll!!! Felizmente, uma banda, apenas uma banda, soube corrigir o rumo das coisas e colocar a cerveja em seu devido lugar, como o ponto central de inspiração para suas canções.
O Tankard, das assim chamadas quatro grandes bandas do thrash metal alemão, foi a que menos cresceu, em termos de mercado, mas isso não diminuiu a sede que impulsiona sua existência . O Kreator se leva a sério demais; o Destruction encarna todas as especificidades do estilo thrash; o Sodom assumiu um postura motorheadiana com foco nos temas de guerra… o Tankard, por outro lado, agregou o que podia do punk e do hardcore e trouxe isso para a mesa do bar, onde os amigos sentam e avacalham com os assuntos sérios, conversam besteira e dão risada. O que existe de melhor pra fazer na vida???
Esse album é uma coletânea de regravações feito para comemorar os 25 anos da banda. São os maiores clássicos da primeira fase da carreira, refeitos pela atual formação, que mantem-se entrosada e inalterada pelos últimos 15 anos. Embora esse tipo de disco seja recebido com algumas ressalvas pela maioria, o presente trabalho pode ser apreciado sem objeções, pois o Tankard não sofreu mudanças significativas na sua sonoridade ao longo do tempo, então não haverá descaracterização nas canções apresentadas. O diferencial, portanto, está na oportunidade de ouvir as músicas antigas com uma produção melhor. Só para constar, ressalto que o disco vem com um cd bonus com um tributo de várias bandas ao Tankard, mas o meu foco aqui é a banda principal.
A ordem das faixas obedece o critério cronológico, então a primeira música só poderia ser Zombie Attack, que abriu o disco de estréia da banda, de mesmo nome, lançado em 1986. Preferências pessoais à parte, eu gosto mais dessa versão do que da original, por achar que ela tem mais ataque, principalmente no primeiro compasso do refrão. A partir dela, segue-se uma bem selecionada seleção de clássicos, percorrendo tudo que a banda fez em seus oito primeiros discos, de Zombie Attack até The Tankard, acrescentando o EP Alien na conta.  Estão presentes, portanto, músicas como Don´t Panic, a punk rock Space Beer, 666 Packs, Beermuda, (Empty) Tankard, o medley com Alcohol, Puke, Mon Cheri e Wonderful Life, e, concluindo o album, uma das minhas preferidas: Minds on the Moon.
O legal do Tankard é que, apesar da fama mundial, a banda existe por puro amor à música, tal qual qualquer banda de algum amigo seu. Ninguém ali sobrevive da carreira musical, todos tem emprego fixo e o Tankard funciona durante as folgas, como uma atividade prazerosa.

Assim como a cerveja depois do expediente.