SIGUR ROS - Ágætis Byrjun
Toda a produção de ficção científica é calcada,
pura e simplesmente, na história e na realidade. Não há como a mente humana
gerar algo que seja absolutamente alienígena. Tudo não passa da interpretação
exagerada de costumes, roupas, arquitetura e demais pontos característicos de
culturas - sob o ponto de vista do observador - exóticas (sem falar na
antropomorfização de aspectos animais e vegetais).
Esse pequeno preâmbulo é apenas para que eu possa
tentar explicar um pouco do estranhamento que tive ao ouvir o Sigur Rós pela
primeira vez. Aquele sotaque e aquelas letras, com estruturas fonéticas tão
estranhas para os ouvidos mais acostumados com as frases concebidas em língua
inglesa e línguas latinas, chamam imediatamente a atenção para o inusitado. Soam,
de certa forma, alienígenas. Mesmo canções em idiomas árabes, orientais ou da
Alemanha parecem ser mais naturais aos nossos ouvidos, talvez por conta da forte
presença desses povos em nosso país, mas a Islândia, nação de origem da banda,
permanece como um lugar sobre o qual deveriamos aprender mais. Trata-se de um
país nórdico insular, distante e isolado, com paisagens de desertos gelados e
geiseres ativos, e, quando visualizamos as imagens desses locais, percebemos
que aquele meio ambiente influencia fortemente a forma como a música soa. As
canções transmitem uma dose de melancolia tão associada a regiões frias quanto
o reggae, por exemplo, pode ser associado a climas mais quentes. O sotaque em
que as canções são entoadas, conforme já foi dito, pode até inicialmente causar
uma distração da parte instrumental, mas não tarda para que essa também venha a
lhe instigar, pela sua peculiaridade. Uma música como a faixa Svefn-G-Englar
consegue lhe absorver plenamente, ao tempo em que lhe passa aquela sensação de
estar tentando correr na água ou se movendo em um sonho. As próprias letras
reforçam a sensação onírica, sendo bastante poéticas e casando perfeitamente
com as melodias.
Apesar de ter bastante personalidade, em momentos
esparsos do disco eu percebi semelhanças com algumas coisas feitas pelo
Smashing Pumpkins (como em Staralfur), e, em outros momentos, era lembrado de
um ou outro trecho mais climático do The Wall, do Pink Floyd (como em Hjartad
Hamast). Como esse é o segundo disco da banda, me parece que o estilo do
conjunto ainda estava em desenvolvimento, tanto que em álbuns seguintes eu já
não consegui mais fazer essas associações de semelhança, reconhecendo-os apenas
pelo estilo Sigur Rós de fazer música. E, para tentar situar quem nunca ouviu
nada do conjunto, eu imagino que eles se encaixam mais apropriadamente no nicho
do rock progressivo, embora a palavra “rock” caiba aqui apenas pela utilização
convencional do termo. Eles, em muitos momento, irão resvalar no terreno da
música ambiente. Uma faixa como Ný Batterí, cuja segunda parte é marcada por
uma levada de bateria, transita entre esses dois mundos: o progressivo e o
ambiente. E que fique claro que a tal levada não é algo com batidas de impacto evidente, mas, no contexto completo do
disco, a sua simples presença já surge como fator de destaque, fazendo uma
pequena quebra na suavidade densa do som.
Enfim, é um disco MUITO bom e MUITO interessante,
mas caso queira conhecê-lo, que fique claro: não é música para acompanhar com
braços erguidos e palmas, não é música para pisar no acelerador do carro, não é
música para embalar o bate-papo enquanto toma cerveja, embora, caso se queira,
nada impede ninguém de fazê-lo. Pessoalmente, creio que ela seja mais adequada
para a contemplação, o momento de sossego, ou para acompanhar a leitura de um
livro. Talvez, um de ficção
científica.
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